Uma tarde diferente na Assembleia Nacional…

terça-feira, 20 de setembro de 2011
Decorriam os finais dos anos 90. Havia sido decidido em Conselho de Administração da Assembleia Nacional, prover o edifício de estruturas adequadas que permitissem a entrada e a circulação no interior da casa parlamentar de cidadãos portadores de deficiência.

Ora bem, rampas exteriores e interiores prontas e colocadas, acordou-se com a Associação Nacional dos Deficientes de que a partir da tarde desse dia, já poderia informar os seus associados de que a Assembleia Nacional estava já em condições de os acolher para uma visita.

E foi assim que - nessa tarde a que chamei “diferente” no título deste escrito - ao entrar na Assembleia Nacional para me dirigir ao gabinete, vejo um movimento desusado até aí, de muitas cadeiras de rodas e de caras alegres dos seus ocupantes e algumas agradavelmente surpreendidas pelo à-vontade com que se movimentavam pela primeira vez, no interior do Parlamento de que apenas conheceriam o exterior.

Descarregados os documentos na secretária e verificados os mais urgentes a tratar, saí do gabinete e dirigi-me ao balcão para contemplar o movimento em baixo, no grande hall, por onde circulavam os visitantes especiais desse dia em direcção ao salão nobre. Debrucei-me para melhor contemplar, quando senti uma mão atrás de mim que apertava a minha mão em silêncio. Virei-me e deparei-me com o Presidente da Associação Nacional dos Deficientes, o Eng. David Cardoso, que continuava a apertar-me a mão sem pronunciar palavra alguma e os nossos olhares encontraram-se. Senti que uma espécie de emoção muito forte inundava-me e que as lágrimas já estavam a espreitar…

Lá ficámos uns segundos sem conseguir articular qualquer som de parte a parte e pensei comigo própria sem conseguir expressá-lo: “Como pequenas coisas feitas com determinação para bem servir, conseguem fazer uma enorme diferença!”

Daquela forma tinha a casa parlamentar cabo-verdiana dado um passo importante no cumprimento da lei das acessibilidades que seria proximamente ou, fora então recentemente aprovada, já não me recordo exactamente a ordem dos procedimentos. Só sei que essa tarde ficou-me memorável por ter presenciado a satisfação estampada nos rostos desses visitantes que pela primeira vez puderam penetrar no interior do Palácio da Assembleia Nacional.

A minha ira contra a Electra e o Bilinguismo entre nós…

sábado, 10 de setembro de 2011
Reparando no título do meu escrito, ele mais parece resultado de alguma insanidade lógica do que outra coisa.
Sim, o que tem a ver o bilinguismo com a falta de energia de que a nossa cidade capital vem sendo vítima? Sim, que tem a ver uma coisa com outra?...
Ora bem, aparentemente nada de semelhante os aproxima, os dois temas. O problema, ou melhor, o dilema foi meu; se havia de desabafar a minha ira vulcânica sobre o incómodo, o desconforto e os estragos que me vêm sendo provocados devido aos cortes frequentes de energia, para não dizer já sistemáticos, com “picos” de 13 (treze) horas seguidas, na minha zona; ou, se havia de discorrer um pouco sobre o bilinguismo no contexto actual das duas línguas cabo-verdianas.
Mas se me permitem, abro um parêntesis para o desabafo contra a Electra, correndo embora o risco, de ficar a meio do texto…se faltar a electricidade neste ínterim.
Sempre vou dizendo que chega a ser uma forma de violência cívica exercida sobre o cidadão que paga religiosamente as suas contas de luz, esta justificação já estafada e com contornos de círculo vicioso de que a Electra é “obrigada” a cortar a energia aos que têm as suas contas em dia, aos que cumprem com as suas obrigações, por causa da falta de receitas para comprar combustível, dada a percentagem elevada dos habitantes da Praia que roubam electricidade (os quais nunca sofrem cortes de luz e que até se gabam e se ufanam disso para quem os quiser ouvir)?!
Convenhamos que isso chega a ser simplesmente insuportável!
E então? Meus senhores? Não conseguimos resolver isto?
Interrogo-me sobre o que fazem os responsáveis? Será que estão a trabalhar? A gerir? A inspeccionar? A procurar solucionar os problemas? Ao menos os do dia-a-dia? Não há uma programação para os “cortes” na qual o cliente da Electra ficasse ou fosse minimamente avisado?... A exemplo do que fazem no Mindelo? Por onde param na capital os engenheiros/gestores que determinam os momentos, as horas de corte ao fornecimento de energia às diferentes zonas da cidade da Praia? Os aparelhos eléctricos domésticos estragam-se com a violência desse selvático processo de interrupção de energia e ninguém é por isso responsabilizado!?
A sensação com que infelizmente se fica, é que pouquíssimo se está a laborar neste particular, para se resolver tão grave problema! Que é a falta de luz e também de água em alguns bairros, no maior agregado populacional das ilhas.
A impressão que o cidadão tem de grande parte dos altos responsáveis do país (as excepções, se as há, já são uma espécie em extinção rápida) é que eles, uma vez chegados ao gabinete, sentam-se pachorrentamente em frente do computador (têm energia assegurada pelos geradores do serviço) – desligam-se do resto que é a sua obrigação primeira – a ver, a escutar, a jogar, a ouvir programas outros, do que realmente a trabalhar para o fim para que foram nomeados, a tentar soluções para o sector sob sua tutela e responsabilidade. E sobretudo, sem corresponder (o trabalho produzido) à proporção do que ganham mensalmente, com o dinheiro dos Contribuintes que somos todos nós!
Não pode ser! Vamos exigir que trabalhem! É o mínimo que se lhes pede! Que trabalhem! Por favor! Trabalhem para este país! Este país que não é auto-sustentável e que tem gravíssimos problemas estruturais e de subsistência!
Tentem, mas tentem mesmo, resolver, solucionar de vez, este gravissímo problema.
E não é que com esta conversa toda acabei por me alongar e me desviar do tema que o título do texto anunciou?
Fecho o parêntesis e se calhar o escrito também e voltarei com o próximo, desta feita versando alguns aspectos do fenómeno bilingue entre nós.

Droga em casa; venda à porta do Liceu…

domingo, 4 de setembro de 2011
Esta é uma pequena e trágica história – que ouvi contar, não há muito tempo – de uma mãe de família (monoparental e disfuncional) do Bairro da Várzea na Praia
Vou narrá-la de forma curta e sem floreados, pois que, por mais volta que eu lhe pretenda dar ela é cruel de mais para que a sua narração comporte qualquer eufemismo.

Pois bem, a senhora tinha ou, ainda tem como actividade de sustento familiar, a venda de substâncias alucinogénias (droga) à porta do Liceu. Guardava o produto em casa, escondido dos filhos, de idades próximas das dos seus clientes…

Mas chega um dia em que dois dos filhos mais crescidos, um rapaz e uma menina adolescentes, descobrem o que a mãe vendia diariamente à porta de um estabelecimento de ensino. Resolvem provar o produto. Tomam-lhe algum gosto e passam a roubar e a usar em casa alguma porção da destinada à venda.

Nesse ínterim, a mãe foi-se apercebendo de que algo andava mal com os filhos pois que revelavam preocupantes alterações comportamentais tanto em casa, com na rua. Além do mais, ela já tinha intuído também que o produto para venda estava a ser domesticamente subtraído.

Descoberto tudo, entre gritos, zangas e ralhos, acudiram alguns vizinhos aos quais, – em grande pranto e berreiro – a vendedora de droga a adolescentes contou a desgraça que lhe caiu em casa.

Ora bem, entre comiserações e palavras de circunstâncias ditas por alguns dos presentes, sobressaiu uma vizinha que – sem papas na língua e bem colérica – lhe atirou:
- Bem feita para ti! Não andas a desgraçar os filhos dos outros? Ou não pensaste que o que estás a fazer podia cair também nos teus filhos?... - (traduzido do crioulo em que foi originalmente dito)

Sem mais comentários!

Moral da história? A existir e se é que se pode dizer assim, cada um retire a que achar correcta.