O lítio e os nossos litígios paroquiais

sábado, 23 de novembro de 2019



     Por estes dias, muito se tem falado nas reservas de lítio que o país pretende explorar, sabendo-se da sua abundância no território nacional. Considerado o petróleo do futuro, o interesse pelo lítio despertou quando começou a incrementar-se o seu uso nas baterias dos automóveis eléctricos. De facto, Portugal possui a sexta maior reserva mundial deste metal e a maior da Europa Ocidental. Conforme noticiado na imprensa, as seis principais reservas localizam-se na serra de Arga (dividida pelos concelhos de Caminha, Ponte de Lima e Viana do Castelo), em Covas do Barroso (Boticas), Barca d'Alva (Figueira de Castelo Rodrigo), Guarda, Mangualde e Segura (Idanha-a-Nova). 
      Há quem esteja seguro da importância estratégica que o lítio vai revestir nos tempos mais próximos, com um impacto no xadrez geopolítico à semelhança do que aconteceu e ainda acontece com o petróleo, e então imagina-se um mundo doravante mais dependente do lítio do que daquele combustível fóssil, o que certamente revalorizará o continente sul-americano, onde se localizam as maiores reservas planetárias, nomeadamente no Chile e na Bolívia, que poderão assim vir a equiparar-se aos países árabes maiores produtores de petróleo. Ligando as pontas, pergunta-se se é por mero acaso que aqueles dois países passam neste momento por uma instabilidade política.
      Quando, há alguns anos, tomei conhecimento do que seria uma boa notícia para os portugueses, pensei com os meus botões: − até que enfim acontece algo de bom, algo promissor que poderá romper com o ciclo de restrições que nos aprisiona e inibe a soltura do corpo e da alma. Porém, a inocência deste pensamento singelo não escondia a suspeição de que tudo poderá não vir a revelar-se fácil e escorreito na concretização do objectivo visado. É que a nossa memória colectiva regista várias oportunidades históricas que se perderam por causa de uma insuficiente agregação e cimentação de valores colectivos. Com efeito, foi com a epopeia dos descobrimentos e o comércio rendoso das especiarias da Índia, foi com o ouro do Brasil, foi com as potencialidades que as antigas colónias ofereciam, e foi, em certa medida, com os enormes recursos recebidos da CEE/UE no decurso da nossa adesão a essa comunidade. Apesar de auspiciosas, Portugal não conseguiu cavalgar devidamente essas oportunidades, continuando o mesmo país rural, pobre e atrasado, e em permanente ciclotimia. Ainda assim, a nossa inclusão na comunidade europeia representa uma oportunidade ainda não prescrita de virar definitivamente a página, se bem que inquieta que o enorme caudal de recursos comunitários destinados a Portugal não se tenha traduzido ainda em tabelas salariais mais condignas e mais próximas das da média da União Europeia.
      Sucede que desde que o governo colocou na sua agenda a exploração do lítio não tardaram a vir à cena várias associações ambientalistas, câmaras municipais, juntas de freguesia e grupos de cidadãos a protestar contra essa intenção, indiferentes às explicações sobre a importância daquele recurso para a transição energética. No âmbito dos ambientalistas, a QUERCUS exigiu a suspensão imediata do processo, argumentando que a extracção mineira pode comprometer as metas assumidas por Portugal relativamente à descarbonização da economia. Quanto à associação ZERO, ela recusa qualquer exploração em zonas protegidas, entendendo que no resto do território a análise deve ser feita caso a caso. Além disso, exige uma Avaliação Ambiental Estratégica sobre o impacto desta exploração na globalidade do país. Em resposta, o Governo deixou claro que naturalmente será feito um estudo de impacto ambiental para uma avaliação objectiva antes de tomar uma decisão concreta sobre cada caso. No entanto, tanto o Governo como a generalidade do mundo científico fazem questão de sublinhar que a exploração do lítio é uma alternativa ao petróleo, cuja pegada de carbono tem a dimensão que se conhece e ameaça o equilíbrio ecológico do planeta.
      No programa Prós e Contras do passado dia 11 do corrente, o lítio foi o tema tratado, tendo sido confrontadas opiniões as mais diversas, estando presente o secretário de Estado adjunto da Energia, João Galamba, que exprimiu e explicitou a posição do Governo. A moderadora do programa, Fátima Campos Ferreira, soube estar à altura da sua função, mostrando uma rigorosa equidistância relativamente às diferentes intervenções. No fim, fiquei com a convicção de que estamos longe de um consenso sobre a exploração deste recurso, muito devido à prevalência de uma visão paroquial sobre o interesse colectivo. Admite-se, contudo, que os contestatários não estarão contra o lítio se os eventuais efeitos poluentes da sua exploração se produzirem noutro quintal que não os seus.
      Em 13 do corrente, o mesmo secretário de estado foi entrevistado na SIC pelo jornalista de economia José Gomes Ferreira sobre a questão do lítio. O jornalista, como sempre astucioso e matreiro nas suas perguntas, algumas delas pertinentes, pareceu, no entanto, encarar o governante como alguém impregnado de uma peste a necessitar de erradicação antes que contamine a comunidade. Pouco se preocupou com o cabal esclarecimento público, mais apostado em apanhar em falso o entrevistado.
      Desta forma, é de recear que a exploração do lítio venha a naufragar no tumulto das nossas divergências congénitas, perdendo-se mais uma oportunidade histórica. É o mesmo que acontece com as reformas estruturais geralmente reconhecidas como indispensáveis à sustentabilidade das contas públicas e que governos sucessivos não têm conseguido implementar, pela dificuldade de obter consenso em torno de matérias essenciais. O entendimento genérico é que haja reformas, sim, desde que não interfiram com os interesses da minha autarquia, da minha corporação e dos meus negócios, ou com as minhas convicções ambientalistas ou outras.
      Recentemente, passei os olhos pela História de Portugal de Oliveira Martins, que traça do Infante D.Henrique o retrato moral e psicológico de um “homem duro para as afeições, desapiedado e esquivo”, e no entanto reconhecendo-lhe os atributos de audácia temerária e persistência tenaz com que levou a cabo a gesta dos Descobrimentos. O Infante não olhava a meios para atingir os seus fins e fez ouvidos moucos aos que se opuseram aos seus projectos então considerados dispendiosos e arrojados, mas a verdade é que com a sua acção Portugal se inscreveu na História Universal com letras graúdas. Será que se tem de concluir que só estamos fadados a grandes cometimentos com a liderança de poderes absolutos e totalitários? Que a democracia contém o ónus de algo incontrolável que nos estorva e estrangula pela simples dificuldade em interpretar correctamente a essência dos seus preceitos?
      Precisamos do lítio, de reformas administrativas profundas e, acima de tudo, de bom senso, de contenção de excessos de estado de alma e de convergência efectiva e assumida em torno dos objectivos comuns, em detrimento do egotismo, do individualismo e do paroquialismo que estreitam a nossa margem de sucesso na luta contra a adversidade. Só assim se criam condições reais para que possamos beneficiar, como é desejo de todos, de melhores salários, melhores pensões de reforma, melhor saúde, melhor habitação e melhor ensino. A democracia tem de ser encarada como potenciadora dos valores que enriquecem o homem e a sociedade e promovem e alicerçam a construção do futuro. Não podemos é continuar na mesma senda, divididos, confusos e estagnados em impasses colectivos.  

Tomar, Novembro de 2019
Adriano Miranda Lima

Racismo? Xenofobia? Ignorância?...

terça-feira, 19 de novembro de 2019



Ultimamente tenho ouvido, assistido e partilhado cenas hilariantes algumas, surreais outras, e confrangedoras quase todas, ocorridas à chegada de nacionais nos aeroportos do país.
Tudo isso se tem passado nos nossos aeroportos, com a polícia de fronteira, à chegada de passageiros, sobretudo de cabo-verdianos que trabalham no estrangeiro e que vêm de visita à  terra. Diga-se em abono da verdade, que de uma maneira geral, essa mesma polícia acolhe-nos com uma sobranceria tal, que nos leva a questionar porque será? É como se estivessem a fazer um frete e nós fôssemos os culpados. Isto tudo depois de longas, desorganizadas, demoradas e penosas filas, para o carimbar dos passaportes. E para quem vem estafado e desgastado de viagem, por vezes longa, e que só almeja chegar à casa ou ao hotel para descansar, convenhamos que não é propriamente a melhor recepção. E isso tem sido bastante notório recorrentemente, nos  tempos recentes, melhor dito, ultimamente.
 A propósito disto tudo, a par de muitas histórias das quais tenho conhecimento, não resisto contar esta que se passou com uma das minhas sobrinhas, filha do meu irmão, que veio este ano de férias com os filhos a quem queria mostrar a terra natal, a sua ilha, o Sal. Chegados  à fronteira, o atendimento da agente policial não foi de modos, teimava categoricamente com a minha sobrinha que ela não poderia ser cabo-verdiana, porque era, cito: “branca, loira e de olhos azuis”. Imaginem o argumento? Nem sequer a agente teve o bom senso e o discernimento mínimo de verificar a gratuidade da sua atitude agressiva e antipática, incompatível com as funções que exerce de anfitrião – admitindo que ela não fosse cabo-verdiana – de um país que tem no turismo uma das suas grandes fontes de receita. A elegância e a simpatia não significam menor firmeza nem menor rigor no cumprimento das suas funções.
Mas vamos por partes, a minha sobrinha é cabo-verdiana dos quatro costados como sói dizer-se, a mãe é de São Nicolau e o pai do Fogo. A sua ascendência (avós e bisavós) remontam às ilhas de São Nicolau, Santo Antão, Fogo e São Vicente. Por sinal, tenho organizada a nossa àrvore genealógica.
Mas que vem a ser isso? Um acto de racismo? De xenofobia? Ou de puro desconhecimento do fenótipo diverso do mestiço?
Os tipos cabo-verdianos, e graças à nossa bela mestiçagem, podem variar do negro ao branco, passando pelo mulato, pelo mestiço de tez mais clara, ou mais escura, de olhos claros, ou não, de cabelos lisos ou crespos, já que a cor do cabelo pode ser artificial. Todos estes tipos, acontecem entre nós. As misturas dão tudo isso. Ou a senhora Agente não aprendeu isso?
Bem a troca de palavras chegou a tal ponto com a recusa da agente em considerar cabo-verdiana a minha sobrinha, que a determinada altura esta se desfez em lágrimas, porque se sentiu vexada e humilhada frente aos filhos, ao ser alvo de um acto de racismo e de discriminação totalmente gratuito.
 Terá sido pouca sorte ter sido atendida por uma desconhecedora do fenótipo cabo-verdiano? Ou são procedimentos ditados pela falta de informação/formação profissional?  É que para quem trabalha na polícia e, sobretudo, na fronteira o conhecimento do fenótipo cabo-verdiano é básico e elementar. Isto é, o aspecto visível, resultante da combinação entre os nossos traços hereditários e as condições do meio ambiente em que vivemos... E nesta conformidade o cabo-verdiano é portador de uma fenotopologia diversa. De Santo Antão à Brava passámos por todos os tipos.  Sempre tivemos e continuamos a ter, diversos tipos, as autoridades - por dever de ofício - deviam ser as primeiras a reconhecê-los.
Portanto, definir o cabo-verdiano, de forma definitiva e acabada pelo seu aspecto é um risco que só deve ser corrido com muita cautela e prudência para não ferir gratuitamente susceptibilidades.
Vou ainda contar de forma muito breve uma história que se passou com uma antiga aluna minha e boa amiga, natural da Praia; passada no aeroporto da Praia. Havia saído da sua cidade, um mês antes para férias nos Estado Unidos; regressada ao país foi também atendida por uma agente. Esta ter-lhe-ia questionado se ela era cabo-verdiana, ao que a minha jovem amiga retorquiu com humor para disfarçar a ira que queria tomar conta dela: “Senhora Agente, sou cabo-verdiana desde 1460... e acrescentou-me ela com graça: “...resta saber se ela percebeu o que eu quis dizer”. Como nota, adito que essa minha antiga aluna e amiga é uma mestiça de tez clara e cabelos lisos…
Comigo tem-se passado também algo estranho, saio e entro com frequência no aeroporto da Praia e ultimamente, invariavelmente, de cada vez que entro, apresentado o passaporte cabo-verdiano, sou perguntada há quanto tempo vivo na Praia. E a minha resposta tem sido: “há cinquenta anos e a senhora agente se calhar nem era nascida...”
Brincadeira, humor e indignação à parte, vamos instruir seriamente os nossos agentes que o cabo-verdiano é mestiço, e como tal pode-se encontrar um largo espectro de fenótipos, com diferentes tonalidades de tez, cabelos e cor de olhos. Assim feito, evitam-se situações que não só possam ferir susceptilidades na abordagem ao ser cabo-verdiano ou não, mas também configurar atitudes racistas, xenófobas ou de desconhecimento da sua própria História e da sua cultura.
Posso afirmar - da minha experiência  -  que nunca antes havia acontecido com tamanha frequência como agora, essas cenas na fronteira aeroportuária. De tal modo frequentes, que chego a questionar se será uma orientação recebida? um figurino a seguir? Não, não creio...
Ninguém está a pedir que os agentes tenham sempre um sorriso rasgado no atendimento de cada passageiro.  Não. Não se trata disso. O que  solicitamos encarecidamente, é que haja atendimento profissional - cortês, correcto, demonstrando conhecimentos  -  e não esta triste e inútil demonstração de falta de conhecimentos elementares.  
Será que a leitura do nosso documento de identificação de viagem – o passaporte – não diz nada ???...
Ora bem, há que encarar isso com espírito pedagógico. Isto é, precisamos de fornecer aos nossos agentes policiais, atendentes nos postos fronteiriços dos aeroportos nacionais, formação e informação sobre as origens e o cruzamento de raças que originaram o cabo-verdiano, mestiço na sua fenotopologia e mestiço na sua cultura. Esses são os nossos traços naturais.
Queremos e desejamos ter sempre a máxima consideração para com a nossa polícia fronteiriça para que ela possa com segurança  – possuidora de  informação e de conhecimento    desempenhar eficazmente, a nobre missão de que está imbuída.


A fealdade de certa paisagem urbana nas nossas ilhas

sábado, 9 de novembro de 2019





  Há tempos, li o comentário de um conterrâneo que era de veemente severidade sobre a realidade da paisagem urbana do Mindelo da actualidade. Entre outros mimos, disse que a cidade parece uma grande favela, o que não é exagero se incluirmos na apreciação certas zonas periféricas. Mas também já li desabafos diferentes mas não menos depreciativos, como dizer-se que em certas zonas a cidade se assemelha a bairros pobres de comunidades do Médio Oriente ou do Corno de África, quer pela tipologia das habitações, que nada tem a ver com a arquitectura que mais nos caracteriza, quer pela ausência de qualquer ideia de ordenamento. Com particular singularidade, outra apreciação comparava os arredores do Mindelo a uma cidade bombardeada.

      Os que de fora nos visitam têm idêntica opinião. Por exemplo, um amigo meu português, que amiúde vai de férias às nossas ilhas, por gostar da nossa gente, regressou há dias da Boavista e confessou-me que não compreende por que em Cabo Verde cada um constrói a seu bel-prazer, sem regra e sem respeito por uma ideia de integração num conjunto.

      O que tudo isto tem de verdade no Mindelo, será porventura ainda mais gravoso noutras cidades, como a Praia. Com efeito, estamos perante falhas clamorosas ao nível da arquitectura paisagística, no Mindelo como em outras cidades cabo-verdianas que cresceram à margem de regras que são imperativas numa cidade que se preze. A arquitectura das cidades, por princípio, deve integrar as artes criativas, as ciências naturais e as ciências sociais, e da sua conjugação resultam soluções que sempre têm de se coadunar com a história, a cultura e a traça dominante herdada do passado. Nada disto se verifica na nossa terra e a pergunta que se põe é se tudo se deve à impreparação ou incompetência dos arquitectos. Direi que não porque os nossos arquitectos têm a ciência necessária para conceber qualquer tipo de projecto.

      O que sucede na nossa terra é que não há nem nunca houve rei nem roque nesta matéria, desde a independência, sobretudo a partir de 1990. Cada um faz o que lhe apetece e sempre em obediência ao seu gosto ou interesse pessoal, marimbando para o colectivo. Por isso, razão tem a pessoa que considera Mindelo uma vasta favela e não uma cidade que devia primar por um mínimo de bom gosto, decência e funcionalidade. E, cereja amarga em cima do bolo azedo, é essa ausência de acabamento exterior em grande parte das construções, pelo que resulta da amálgama de casas sem estética uma paisagem feia, sem graça, incaracterística, além do grave problema de se inscreverem em ruas mal traçadas, desconexas, anquilosadas, sem espaço sequer, em inúmeros casos, para fins utilitários e públicos, como acesso a ambulâncias, viaturas de bombeiros, etc.

      Então, se não é uma questão de falta de arquitectos capazes, o mal só pode ser atribuível a corrupção ou demissão de responsabilidades ao nível das autarquias. A começar, pois, pelas autoridades, que não agem ou hesitam em agir de acordo com as suas competências e responsabilidades, ou que, mais grave ainda, não estabelecem baias intransponíveis entre o interesse público e o privado, dando azo a situações de duvidosa legitimidade, ou mesmo de flagrante transgressão, isto para ser mais eufemístico do que assertivo nas minhas palavras.
    
      Depois, não é difícil imaginar que a demissão, apatia ou inacção de quem governa tem um efeito de autêntica permissão e aval aos desmandos das empresas construtoras e dos próprios cidadãos. Assim, direi que o mal se entrelaça de tal forma que não se sabe onde começa e onde acaba, nem quando vai ter fim ou se é mesmo possível pôr-lhe um fim. O que está em causa pode ser mais propriamente aquele tipo de transgressão que é fruto de favoritismo, cedência, lassidão, desleixo, hábitos paroquialmente enraizados nos meios em que quase toda a gente se conhece. Poderá, por enquanto, não assumir a escala das situações mais gravosas nas suas repercussões sociais, em que a criminalidade se aloja dissimuladamente; mas, silenciosamente, sub-repticiamente, a fenomenologia dos comportamentos deletérios vai-se instalando e ganhando proporções crescentes, produzindo os seus efeitos melífluos. É como certo tipo de cancros.

      No fundo, o mal está na comunidade como um todo, na sua mentalidade de conformismo e permissividade, que é sintomática de uma insuficiente consciência cívica e identitária. A simples constatação da proliferação desses inúmeros caixotes de maior ou menor tamanho em detrimento da bonita traça colonial de muitas construções que herdámos, diz-nos de uma realidade que não podemos ignorar e temos de lastimar e condenar. Aos poucos, se não houver contenção e travão aos desmandos, as nossas cidades vão-se assemelhando a muitas grandes favelas de qualquer outra cidade africana sem história e sem passado digno de registo.

      Contudo, penso que aos nossos arquitectos cabe uma particular e intransmissível responsabilidade. Pela sua formação académica, deviam ser os primeiros a agir em defesa do nosso legado patrimonial, em vez de caucionarem, activa ou passivamente, as transgressões sucessivas que nos conduziram à situação que várias fotografias do Mindelo e outras cidades vêm reportando.

      É preciso ver que a oferta turística das nossas ilhas tem muito a ver com a singularidade arquitectónica das suas urbes. Podem ser pequenas e pobres, mas se se lhes tira a alma, tudo se perde. Será um erro imperdoável importar o que de pior existe lá fora, mais ainda se forem imitações grosseiras e em desconexão com a nossa realidade cultural.


Adriano Miranda Lima