O Parlamento do nosso Descontentamento

quarta-feira, 23 de novembro de 2011
Ontem o nosso Parlamento deu-nos mais uma boa oportunidade de maldizer legitimamente a classe política. E, por favor, não apontem o dedo apenas ao deputado do MpD que com clareza e veemência saiu em defesa do seu líder. Foi excessivo. Mas não foi menos indigno, deselegante e vil o líder parlamentar do PAICV que em reacção e defesa do seu presidente de partido, o atacou. E que dizer do PM que espoletou o problema, quiçá como intencional manobra de diversão (que lhe teria resvalado) para desviar o cerne da questão – discussão do Orçamento do Estado?

É neste contexto mais do que em qualquer outro que se insere a conhecida citação de Bertholt Brecht: "Do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento. Mas ninguém chama violentas às margens que o comprimem" o que na Física significa tão-somente que a qualquer acção corresponde uma reacção de sentido contrário e, na política, acrescente-se, de intensidade proporcional à natureza do telhado (vidro, betão ou outro material) do ignitor da acção.

E foi assim. O PM é useiro e vezeiro em dirigir insultos aos adversários. É um hábito que mantém e que lhe vem dos tempos em que era oposição (vide actas da Assembleia e jornais da época). E quando se confronta com uma resposta a altura, encolhe-se, faz-se de vítima e recolhe à sua “concha” apresentando-se logo como o paradigma do político brando, tolerante, impoluto, honesto, ingénuo e puro. E as pessoas que o rodeiam absoluta e selectivamente amnésicas, ávidas de mostrar serviço, saem em sua defesa qual alcateia ferida.

Não sou, nem de perto nem de longe, defensor de incursões pela vida privada de quem quer que seja. Mas o “homem público” não o é só quando está em actividade efectiva, em algumas horas do dia. A sua conduta deve ser em todos os momentos uma referência da ética e da moral vigentes para toda a sociedade e um exemplo para os jovens.

Se é certo que o que se passou no nosso Parlamento é condenável não é menos certo que não é singular nem invulgar em Parlamentos de países com muito mais tradição democrática, como o são p.e. o inglês, o italiano e muitos outros da Europa, da Ásia e das Américas. E não nos armemos em virgens puras como se fosse a primeira vez. Dirigentes e deputados do PAICV na oposição, muitas vezes ultrapassaram a barreira do pessoal para entrar na esfera directa da família o que foi, é e será sempre simplesmente execrável. Como disse Agustina Bessa-Luis “as palavras voam, o que não é escrito é perdido”. Felizmente está tudo escrito e registado.

Mas será que o deputado do MpD faltou à verdade? Se assim foi, ele deve com toda a hombridade e coragem que inegavelmente demonstrou, levantar a sua imunidade parlamentar e submeter-se à justiça. É grave a acusação que fez e fere a imagem, o prestígio e o carácter de um governante digno desse nome. E aqui depende se o PM tem verdadeiramente moral para o incriminar. É é nisto é que está o busílis. Não é na retórica que se seguiu nem no eventualmente, sublinho, eventualmente, politicamente “incorrecto”. Costuma-se dizer que “quem não quer ser lobo que não lhe vista a pele”.

Há uns tempos atrás o PM falava muito pomposamente dos seus pergaminhos da defesa da “família”. A ser sustentável a acusação, (ninguém a contradisse) será que ele tem mesmo moral para falar de família? A acusação não é de poligamia que, quer se goste ou não, (embora ilegal no nosso País) quando institucional assenta numa certa concepção de família solidária. É "multigamia" (não sei se o termo existe) que é como diz, ter muitas famílias com diferentes mulheres, uma perversão da família estruturada e solidária como a conhecemos na cultura cristã.

Já que insistimos e gostamos tanto de fazer comparações com outros países, será que o nosso PM com a sua dita serôdia volubilidade – não se trata de uma desculpável, distante e esquecida “tara” de juventude – teria alguma pequeníssima hipótese de ser político nos Estados Unidos?

Há dias vi um filme de Michael Douglas (já não me lembro do título) que versava sobre um problema de assédio sexual. O protagonista (Michael Douglas) queixava-se de ser alvo de assédio sexual por parte da sua chefe mas não sabia como apresentar isto em tribunal uma vez que se entende como tal, apenas do homem para a mulher e nunca no sentido contrário. Perante o facto, a advogada depois de o ouvir, respondeu-lhe peremptoriamente: vamos avançar com o caso. O assédio sexual não reside no sexo mas na autoridade de quem o faz. E ganhou a causa. E isto em altas esferas de uma grande instituição. Meditemos!...

Pois não deixa de ser intrigante o momento a partir do qual a pessoa do PM ganhou a fama de “garanhão”.

A. Ferreira

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