UM SUSPIRO DE ALÍVIO

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Há mais de uma semana que terminaram as eleições presidenciais. Muito se tem escrito… E com alguma oportunidade e uma certa clareza, na minha óptica, é claro. O assunto está praticamente exaurido. Pouco há a dizer. Deixo aqui o registo muito breve da minha perspectiva.

Todos nós, os que nos consideramos democratas, respirámos de alívio com a eleição de JCF. O espectro de um regime totalitário com máscara democrática perfilava-se no horizonte. O que estava em causa não era um presidente, uma maioria, um governo. É natural e legítimo que qualquer partido político queira ter essa pretensão. Não está a ser honesto o militante que diz o contrário. Quando se disputa é para ganhar. Mas, parece-me, que não é recomendável, em democracia, que tal aconteça, o que só por si, é uma forte razão para que as presidenciais não sejam partidarizadas.

E ainda mais quando a personalidade que encarna o regime é politicamente sufocante, vaidoso e arrogante, como é o nosso caso. Com a agravante de ser, intelectualmente, pouco honesto.

A experiência que vínhamos vivendo, por culpa dos dois protagonistas – PR e PM – de modo algum era encorajadora. De tal forma a não era, que com a vitória expressiva e inequívoca de JCF muita boa gente celebrou mais a derrota do seu adversário do que a sua própria vitoria.

E perante os factos, não me venham agora dizer que o povo mostrou maturidade quando há escassos seis meses esse mesmo povo patenteou uma confrangedora infantilidade da qual iremos pagar não só ao longo dos próximos cinco anos como através de várias gerações mais novas. É que a maturidade não se ganha com um estalar de dedos. Nem é fruto de uma única eleição. Tenhamos pois paciência que havemos de lá chegar. É preferível dizer-se que, desta vez, o povo votou bem, acertou.

JCF e o MpD ganharam a primeira volta das eleições. É esse o seu fiel eleitorado. Não nos iludamos querendo fixá-lo no da 2ª volta. Os resultados “adicionais” da segunda volta são um misto de rejeição, de raiva, de medo e também, naturalmente, de algum apoio. E foi, como obviamente se depreende, para uma boa parte dos eleitores, uma segunda escolha que não há nas outras eleições – legislativas e autárquicas.

É esse eleitorado flutuante, normalmente maduro, que acorreu à segunda volta e cuja dimensão é uma incógnita, é que é necessário conquistar, ao mesmo tempo que se fidelizam os simpatizantes convictos – os da 1ª volta. Para isto é necessário muito trabalho no terreno, muita verdade no discurso e muita seriedade nos actos, para os quais, espero, a oposição se terá despertado.

Nós, os menos jovens, temos ainda bem presente as eleições presidenciais em Portugal de 1986, em que Mário Soares foi vencedor na segunda volta com 50,7% dos votos. Na primeira volta registava-se 25,1% para Soares e 45,8% para Freitas do Amaral. Ficou célebre, na altura, a recomendação de A. Cunhal aos militantes do PCP: “Tapem a cara ao homem, e ponham um X à frente” (leia-se Soares). E quando foi confrontado com o voto do seu partido em Soares, respondeu: ”Não, não votámos nele, votámos contra a direita”. Isto é, num mal menor.

Não quero de maneira nenhuma diminuir o mérito de JCF e do MpD, que pela primeira vez em mais de dez anos saboreia uma vitória nacional. Que ambos bem mereceram. O primeiro pelo seu esforço e pelo seu querer e crer e o segundo pelo trabalho de formiguinha e de empenhamento desenvolvido no terreno, sobretudo pelo seu incansável líder. Curiosamente, foi na diáspora, que JCF considera o terreno de vocação específica das eleições presidenciais – chegou a escrevê-lo – que ele foi derrotado a par desse caso estudo que é o Fogo.

Estamos todos muito contentes e felizes, mas não nos devemos embandeirar em arco. Foi uma grande vitória e, pela primeira vez, desde há mais de uma década não paira no Palácio de Plateau o fantasma da fraude, o que confere ao novo PR moral e autoridade para o combater com a veemência que o "fenómeno" exige, nobilitando a política e a classe política que carecem de ética e de seriedade e, como consequência, de credibilidade.

O que estas eleições também trouxeram de importante é o reconhecimento público pelos próprios militantes do PAICV da fraude por eles “instituída” e instalada com que convivemos e da qual impunemente usufruíram (Covoada, Baluarte, Mãe Joana, entre os casos mais emblemáticos) ao longo desta última década. E quando alguém lá de dentro farisaicamente e com muito oportunismo diz que só agora tomou consciência da ocorrência é para se lhe perguntar onde é que andou estes anos todos? Se não escuta rádio, não lê jornais nem vê televisão?

Ninguém duvida que JCF fará uma boa presidência. Tem todas as condições se for coerente e consequente com as suas próprias palavras e se subordinar ao rigor disciplinar dos julgamentos políticos (e não só!) das suas análises enquanto analista político e social em que se subentendia a velha máxima da “Mulher de César” e que agora esperamos venha a estar presente em todas as nomeações, designações que partam dele ou venham a carecer do seu aval. Não queremos ver mais no nosso País em altos postos da hierarquia do Estado, por nomeação, gente acusada de imoralidade, com processos judiciais de fraude, roubo, falsificações e outras falcatruas.

De momento, a fasquia está baixíssima e não pode servir de referência. JCF herda uma presidência para esquecer – pálida, medíocre e folclorista. E para o cúmulo, acusada de ser a principal instigadora ou, no mínimo, a eminência parda geradora, dos enormes conflitos que grassam no interior do PAICV.

Pior, não era possível…

A. Ferreira

A Língua em tempo de Campanha Presidencial…

domingo, 28 de agosto de 2011


Poderá parecer óbvio e um pouco “banal”, (relevem-me esta vulgaridade expressiva) o tema que aponta o título deste escrito. Embora saiba que em tempo de campanha “tudo se joga” na saudável “caça ao voto” – quando ela é saudável – ou no convencimento do eleitor.

Tudo isto para dizer o seguinte: foi interessante ver escrito e escutar nas quatro candidaturas – nos discursos dos seus candidatos, nos tempos de antena, nas entrevistas, nos cartazes expostos – duas variantes do crioulo ou da língua cabo-verdiana e a língua portuguesa.

Sobre esta última foi notório que todos os candidatos a falam e a dominam com muito à-vontade e fluência. Não vá sem acrescentar que essa mesma fluência e à-vontade em língua portuguesa foram igualmente visíveis e extensivos aos mandatários respectivos e a todo o “staf” das candidaturas que esteve mediático durante o período referido.
O que apreciei positivamente foi a naturalidade com que – em circunstâncias que a pediam – se expressavam na nossa língua segunda.
Nota positiva e merecida vai também para os Jornalistas que fizeram a cobertura – em língua portuguesa – da noite da votação na televisão nacional. Expressaram-se sem ambiguidades, sem confusões e com bom ritmo para os telespectadores, quer para os das ilhas quer para os da Diáspora, com clareza, que acredito que foram bem entendidos por todos os que os escutaram.

Outra curiosidade foi a comunicação em crioulo feita na comunicação social – durante o período eleitoral presidencial – foram maioritariamente utilizadas duas variantes, a de Santiago, quando a comunicação era dirigida às populações das ilhas do sul e a variante de S. Vicente quando essa mesma comunicação eleitoral era destinada à comunidade de eleitores das ilhas do norte. E isto, quer sob forma oral, quer sob forma escrita.

Podem-me ripostar: “Ora isso é óbvio e se calhar de La Palisse...”

Pois bem, não contrariarei o vosso raciocínio. Apenas acrescentarei que na minha opinião, isto revela uma vez mais que os falantes cabo-verdianos são depositários de uma variedade linguística, de uma riqueza comunicativa que vale a pena preservar sem tentar forçar qualquer tipo de homogeneização quer escrita, quer oral, o que acabaria por ser redutora e empobrecedora das variantes de que se compõe a língua cabo-verdiana ou o nosso crioulo.
A finalizar, faltou-me anotar o interessante que seria observar as variantes do crioulo – com “empréstimos,” quer de vocábulos, quer de construções frásicas, das línguas do país de acolhimento respectivo – e das línguas desses mesmos países, através dos quais se teriam comunicado os activistas e os eleitores da nossa Diáspora, durante a campanha eleitoral presidencial. Mas a isso não me abalanço, pois que tal não presenciei.

A casa da infância…

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Tal como diz a personagem «Chiquinho» personagem do romance homónimo de Baltazar Lopes da Silva, «vivi em muitas casas…» umas muito boas, outras, nem tanto, mas nada como a casa da nossa infância! As palavras não serão exactamente as mesmas do romance, daí a dispensa das aspas na frase restante. Mas o conceito, a ideia e o sentimento nelas inscritos serão estes que retive e apreendi do romance citado.
Ora isto, em escala variável, acontece comigo e com esta casa dos Mosteiros.
Todas as vezes que nela entro é um regresso a um passado rico de memórias, de vozes, de preceitos, de regras, algumas rígidas mas que nos guiaram na vida, e de muito afecto também. Memórias de tanta coisa!
Não me canso de a admirar na sua velhice e na sua vetustez respeitáveis. Venero-a como a um templo.
Há qualquer coisa de sagrado nestas paredes grossas, nesta volumetria imensa de telha, de cimento e que já foi de madeira também. O interior da casa convida ao silêncio. A velha sala de visitas não tolera uma telefonia em altos berros. Tudo aqui convida ao murmúrio para que a paz interior seja parte da estada nela.
Da mesma forma, cada peça que nela está - da maior à mais pequena - grande parte dela, é mais, ou quase centenária. É o velho filtro de água, é o velho relógio de corda da parede, são as velhas camas de ferro forjado, o vetusto guarda-loiças, o antiquíssimo e pesado cofre, o guarda-vestidos (por rearmar) a antiga secretária e a escrivaninha dos meus “velhos,” assim também alguns antigos quadros que ainda emolduram as paredes e fundos de bandejas pintados pela minha mãe, sei lá! …
Enfim, tudo ou quase tudo, vem do tempo dos avós, dos pais e chegaram até nós carregados de histórias de família de grandezas e de fraquezas, de coisas íntimas e de afectos que se destinam a ser preservados.
O valor dela (a casa) reside nisto: Tem alma! Tem raça! E tem classe!
Por favor, conservemo-la!








A Candeia de Diógenes

domingo, 21 de agosto de 2011
Terminada a primeira volta das presidenciais e dada a troca de mimos havida entre as duas candidaturas do PAICV sempre esperei encontrar alguma dignidade entre as hostes, sobretudo na que viesse a ser derrotada.

E perante os factos que eu acabaria por verificar, lembrei-me de Diógenes no longínquo século V – IV AC e da sua candeia e associei-o, naturalmente, aos magníficos versos de Sá de Miranda (Séc. XIV – XV ) que transcrevo:

Homem d’un só parecer
D’un só rosto e d’ua só fé
D’antes quebrar que volver
Outra cousa pode ser
Mas de corte homem não é.


Interrogo-me, julgo que com alguma legitimidade, se os interesses partidários deverão sobrepor-se à dignidade e à honra dos militantes enquanto indivíduos ou se é o carácter e a integridade que ditam o comportamento.

É certo que os partidos não pertencem aos seus dirigentes. Estes são transitórios e circunstanciais e são detentores apenas de um mandato circunscrito aos estatutos, regulamentos e outras deliberações. Mas os partidos são uma organização de voluntários. Só lá está quem quer… Não quer isto significar que alguém se demita só porque é contra determinadas directivas. Não, de maneira nenhuma, não obstante a disciplina partidária e a democracia mandem acatar, em qualquer assembleia legítima, a vontade da maioria.

O que não compreendo é como alguém que se considere "Homem" possa dar o dito, durante largos meses, e o não dito, em apenas 24 horas.

Tenho que concordar com JMN quando disse que o seu PAICV estava infestado de ratos e ratazanas e achar que ele só pecou por defeito, ao se ter esquecido de acrescentar alguns invertebrados que por lá rastejam e de ele próprio se incluir no Zoo.

Só assim se compreendem as declarações públicas de apoio ao MIS de alguns dirigentes da candidatura de ARL e as farisaicas de JMN de apelo à união do partido.

A. Ferreira


A Psicose das “Cidades”…



O assunto deve ser recorrente e se calhar, já várias vezes abordado, uma vez que não é já tão recente. Mas acabada de regressar do Fogo, decidi inscrevê-lo no meu “Blog.”
Não sei e nem consigo compreender até hoje o que se passou nas ilustres cabeças do governo, dos legisladores e dos Deputados deste país e desta nação, para transformarem quase todas as vilas e algumas ainda povoados sede de Concelhos, em cidades!
Será que não tiveram ou não têm a noção do que é uma cidade? Isto chega a ser causa de gozo e de gáudio, esta espécie de “loucura colectiva,” qual toque do rei Midas, em tudo transformar em cidade! “loucura colectiva”, repito, embora selectiva, porque oriunda da classe política.
Falo disso com imenso espanto e perplexidade! E mais, falo disso pois tenho muito afecto e respeito à minha antiga Povoação de Igreja nos Mosteiros, ilha do Fogo que “sem mais e nem porquê” se viu da noite para o dia e por força de uma lei esquisitíssima, elevada à categoria de cidade!
Convenhamos que é desprestigiar um antigo povoado que estava a fazer a sua caminhada – em termos de equipamentos e de infra-estruturas – para ser uma vila razoável, sede do Concelho e que sem o mínimo de condições e de critérios urbanísticos para tal, se vê alcandorada em cidade!
Francamente! Não brinquem com a inteligência e o conhecimento do cidadão, meus senhores! A isto chama-se falta de visão urbana e urbanística. Gostaria de realçar que tais atributos vão directamente endossados àqueles que tal determinaram.
Para terminar, volto a repetir: não devem ter noção e não fazem «a mais pálida ideia» do que é uma cidade!

Toda a vigilância é pouca!...

segunda-feira, 15 de agosto de 2011
A união do rebanho obriga
o leão a deitar-se com fome.

Provérbio Africano

“Zangam-se as comadres dizem-se as verdades”. A primeira volta destas eleições presidenciais foi o exemplo mais acabado deste aforismo popular. As acusações de fraude por parte da candidatura de Aristides Lima contra a de Manuel Inocêncio são simplesmente escandalosas e levariam, de imediato, à realização de um inquérito, no mínimo, sumário, com eventuais demissões de membros do Governo, em qualquer País de regime pluralista medianamente sério. A dar crédito à imprensa – muito tímida, inconsistente e parcialmente desmentida – não estariam envolvidos apenas cidadãos comuns, nem os chamados “jagunços”, mas nomes de altos dirigentes do País.

E se é o próprio Chefe de Estado no seu discurso relativo a estas eleições que lança a suspeição, sob a capa de aviso, ao falar de “ambiente de liberdade e livre de quaisquer formas de pressão ou condicionalismos extra-eleitores” numa antevisão do cenário eleitoral, que podemos nós esperar?

Mas também quando o próprio PR, a mais alta autoridade do País, sede da moral institucional, se estribou silenciosamente na mais escandalosa e vergonhosa fraude eleitoral de que há provas no País, assumindo, para o cúmulo dos cúmulos, a posição de vítima – não acredito que não conheça o enquadramento semântico do aforismo – ao dizer que não vale a pena chorar sobre o leite derramado – quem o podia ter dito seria Carlos Veiga – que podemos nós esperar?

Quando o PM deste País numa confrontação directa às leis da República pronuncia-se levianamente junto a uma assembleia de voto em plena decorrência do acto eleitoral ao caso (que nunca provou) de “dinheiro sujo” e fica impune, que podemos nós esperar?

Quando o famigerado ex-director-geral da DGAPE é acusado publicamente de uma estrondosa e vergonhosa fraude eleitoral e, não só fica impune como é sucessivamente promovido faltando apenas a vulgarizada condecoração – o que admira – para a consagração total, que podemos nós esperar?

Quando um juiz do STJ não declara incompatibilidade (moral/ética) num caso de julgamento eleitoral em que ele é implicitamente parte, que podemos nós esperar?

Quando os insuspeitos observadores da CEDEAO recomendam (Que vergonha!)às autoridades (quais?) medidas “contra práticas de intimidação e pressão exercida sobre os eleitores, em particular, no dia da votação” para além de referências a “compra de votos” na Praia e S. Vicente, que podemos nós esperar?

Todo este edifício político-institucional do poder actual em busca de uma total hegemonização (leia-se “ditadura” em democracia) que só as lutas internas não permitiram a sua total consagração, está alicerçado num gigantesco sistema de fraude que estas eleições acabam de confirmar e, quiçá, poderá vir a ratificar.

Perante a máquina montada, muito pouco há a fazer. Não há instâncias que se possam considerar impolutas para se recorrer. Está tudo “corrompido”. O PR não tem moral porque usufrui sem rebuços. O PM não tem também nem moral nem distanciamento porque ele próprio responsável político, moral e material. A justiça auto-mutilou-se: não tem olhos, não tem mãos, nem tem voz. O Parlamento com a maioria silenciada pelos tachos e amordaçada por corrupção é, globalmente, cúmplice. Resta-nos apenas as mal sucedidas manifestações de rua e uma abrangente vigilância dos que querem democracia no País ou uma punição nas urnas (voto em branco ou contra) aos prevaricadores. Ninguém pode abster-se à participação e a uma vigilância permanente. Somos todos responsáveis.

A. Ferreira

A Minha Amiga Firmina

sábado, 13 de agosto de 2011
Há vidas que sem serem propriamente heróicas, merecem ser contadas. Se não no todo, pelo menos parte dela; pois que contém episódios interessantes e ao mesmo tempo reveladores do carácter e da forma de estar na vida da pessoa, não só consigo própria, mas também com os outros.
Assim foi e tem sido a vida da minha amiga Firmina, quem nos verdes anos, emigrou para a Itália, país onde permaneceu durante mais de três décadas.
Hoje ela considera a língua de Dante e a Itália como sua língua e sua segunda terra.
Aí trabalhou como empregada doméstica continuadamente até à reforma numa casa de família – onde ela viu crescer e como acrescenta: “ajudou a criar” os dois filhos do casal – que com ela manteve uma relação amistosa, de tal modo que após o regresso definitivo a Cabo Verde a convidam de dois em dois anos para passar um mês de Verão com eles e retribuem nos intervalos, vindo eles até Cabo Verde visitá-la. De modo que mutuamente as relações são já na actualidade, quase familiares.
Conheço alguns episódios da vida dela, pois que ela mos contou, numa aproximação de amizade já que Firmina e eu frequentamos a mesma paróquia.
Contou-me ela que em criança frequentou uma instituição dirigida por Irmãs religiosas em Santa Catarina, interior da ilha de Santiago. Aí fez a escolarização básica e aprendeu os lavores e a culinária.
Em meados dos anos 60 do século XX, emigrou para Milão com contrato feito com os patrões, os únicos que teve até deixar definitivamente a Itália.
De entre historietas e factos interessantes acontecidos durante a estada no país de acolhimento, reporto um devidamente autorizada para tal fazer pois, longe de mim querer aqui imprimir qualquer sentimento negativo em relação a uma vida laboriosa e honesta como foi e é a da minha amiga Firmina que tanto a orgulha! E isso, na minha opinião, vinda de alguém que me parece ser portadora de uma modéstia e de uma generosidade naturais, sem artifícios.
Recém chegada a Milão, tratou de frequentar um curso nocturno para aprender italiano o que aconteceu com sucesso.
Levava na sua “bagagem” ética, valores que lhe recomendavam que devia cumprir bem as suas obrigações, sem nunca esquecer os seus direitos. Segundo ela, guardou isto como lema que a guiou ao longo dos anos que esteve no estrangeiro.
Ora bem, havia em Milão à época, uma significativa comunidade imigrada, jovem feminina cabo-verdiana (sobretudo oriunda das ilhas de Barlavento) – que tal como a Firmina – era maioritariamente empregada doméstica. Normalmente quase todas se encontravam aos Domingos em locais habituais o que naturalmente acabou por criar laços de forte solidariedade, de amizade entre patrícias que aí se conheceram.
Algumas consideravam-se exploradas pelos patrões que não lhes pagavam o ordenado estipulado no contrato. E mais, até chegavam a reter-lhes os documentos tais como o passaporte e demais papéis para que elas não pudessem reclamar.
Aqui entra a nossa Firmina, que cumpridora das suas obrigações, mas igualmente ciosa dos seus direitos e mais instruída do que a maioria das colegas; transformava-se em perfeita “sindicalista” e numa persistente e acérrima defensora dos direitos das colegas prejudicadas.
Segundo ela, várias vezes foi bater à porta da casa, onde trabalhava a colega mal paga e pedir satisfações aos patrões da patrícia, informando-os de que eles não estavam a cumprir com o que a lei italiana que estipulava em relação ao montante mensal devido. Contou-me que fez isso várias vezes e em algumas delas, foi chamada a polícia que chegou a levá-las (a ela e à colega que defendia) para a esquadra sendo queixosas as patroas. Mas a Firmina que se expressava bem em italiano fazia-se entender muito bem e relatava para o agente policial que ela fora em defesa de uma cidadã estrangeira cujos patrões, não estavam a cumprir com o que assinaram em documento. Acabava quase sempre por ganhar a causa e uma amiga devotada em cada colega que assim defendia.
Fazia isso de forma generosa e arrojada, pois que não devia ser nada fácil a uma empregada doméstica, estrangeira, imigrada e naquela época, ter a ousadia de confrontar patrões da forma como ela o fazia. Alguns chegaram a proibi-la de se abeirar da porta da casa deles para acompanhar a colega que aí trabalhava.
Com tantas intervenções a favor de colegas de trabalho, a minha amiga Firmina ganhou experiência e sabedoria nessa matéria que no fim se tornou conhecida não só dos serviços da emigração, como também dos da segurança social da cidade que já quase a consideravam como uma sindicalista “vera” tal era o empenho com que tratava os assuntos que diziam respeito às cabo-verdianas empregadas domésticas em Milão.
Pois é, tal como disse no início deste escrito há vidas que sem serem heróicas no sentido clássico do termo merecem – com igual mérito – serem reconhecidas como tal.

«Mão à palmatória» …

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Afinal, devo ter sido confiante ou crédula demais no escrito anterior, quando disse que: “pela primeira vez, nesta década,” iria votar sem o fardo de pensar que a “dona fraude iria imperar nos resultados.” Embora o tivesse feito e escrito de boa fé e crente de que tal ia finalmente suceder, tenho de confessar que me enganei. Infelizmente, ainda não foi desta.
Para mal desta democracia e deste país, já são muitas as denúncias insuspeitas vindas a lume, os manifestos indignados, as cartas e os artigos da mesma “família partidária” a denunciar a compra de votos, o que tem sido elucidativo de que vamos continuar com este “pecado capital” que é o de tentar alterar ou impor o que o cidadão tem mais sagrado, que é votar sem qualquer tipo de coacção.
Note-se: desta vez não é apenas a Oposição a queixar-se. As vozes mais ouvidas são oriundas dos que são, eram (?) altas patentes do regime no poder.
O que é certo é que tudo isto confrange e faz-nos sentir envergonhados perante nós próprios e perante a comunidade internacional.
Imaginem o embaraço sentido com um forte “puxão de orelhas” que o relatório dos Observadores nos deu!
Pois bem, o paradoxo de tudo isto é que a maioria dos membros observadores pertencem a países da CEDEAO, onde uma significativa parte vive de golpes e de contra-golpes, onde Chefes de Estado alteram ou mandam alterar leis para se perpetuarem no poder, onde existe na república instituída, quase que explicitamente, o direito de sucessão de pai para filho, como se de monarquia se tratasse. Enfim, onde os Direitos humanos longe estão de ser totalmente respeitados.
Ora bem, foram eles que, com a autoridade adveniente de Observador, escreveram que cá se “compram votos”! Meu Deus a que ponto chegámos! Uma vergonha do tamanho do cosmo…


Desabafo!

domingo, 7 de agosto de 2011
Pela primeira vez, nesta década, fui votar sem a enorme suspeição, sem o pesar antecipado de que a “dona fraude” iria imperar!

E porque é que digo isto? Porque os “mestres” da compra de consciência de eleitores pobres, semi-analfabetos e da diáspora mal esclarecida, os “catedráticos” do voto forçado, não livre, cindiram-se. Hoje estão espalhados entre as duas candidaturas fracturadas. Vão estar atentos e de olho uns nos outros. É que para além de se auto-conhecerem nesta matéria, conhecem-se uns aos outros do tempo em que eram unidos.

Sim, é verdade, desde há muito que não sabia já o que era votar no meu país sem pensar em fraude, em votos de mortos, em votos de ausentes, em duplas inscrições, em rasuras e omissões de nomes nos cadernos eleitorais, em compra de votos, em tomada de bilhetes de identidade, em dinheiro e outras mil formas de vil e de vergonhosa “compra” daquilo que o cidadão tem de mais sagrado, que é a livre escolha do seu candidato e nele votar, sem pressão.

Bem sei que não vai ser a 100%, mas que o nível de fraude desta vez vai diminuir, disto não tenho qualquer dúvida! Só isso, já é um factor de tranquilidade para o cidadão consciente dos seus direitos e deveres.

Como alguém já o escreveu, “a crónica ingenuidade do MPD” estará – nestas eleições presidenciais – desta forma mais salvaguardada pelo adversário. É que desta vez, as reclamações das mesas de voto ou de suspeição de fraude, irão dar entrada, na CNE e/ou nos tribunais em tempo, para serem – esperemos que sim – devidamente apreciadas e julgadas.

Para terminar direi que – se nada de inédito acontecer – qualquer que for o candidato eleito dar-me-ei por satisfeita!

Haja transparência eleitoral!