Candidaturas e Candidatos

sábado, 20 de março de 2021

 

Dentro de pouco menos de um mês teremos as eleições legislativas no País e cerca de seis meses depois, as presidenciais.

Assistimos a uma corrida desenfreada para lugares nas listas dos principais partidos – o pessoal a pôr-se em bicos dos pés.

É também uma oportunidade normalmente utilizada pelos líderes partidários para se desembaraçarem dos deputados incómodos – os que não dobraram a cerviz durante a legislatura a findar ou ousaram apontar com insistência outros caminhos.

Tudo isto porque os partidos políticos deixaram de ser instituições com um bem definido projecto de sociedade, com princípios e valores, uma plataforma do exercício da liberdade e da democracia  – pelo menos interna – onde impere, designadamente, o trabalho político e a meritocracia, para se transformarem numa associação com fortes indícios de autoritarismo em que o mais importante não é o mérito, a competência, o trabalho realizado, mas a fidelidade (não a exigível lealdade) ao líder e a expressão contida ou mesmo condicionada dos militantes.

Por outro lado, há, nestas ocasiões, um movimento de activistas de bem definidas áreas sociopolíticas que não conseguindo cativar um lugar no partido da sua simpatia e sedentos de protagonismo se oferecem, por vezes, com alguma jogada chantagista de permeio, a um outro partido de diferente ideologia programática ao “vender-se” como um grande e disputado quadro e, “comprado” com o rótulo de uma grande aquisição usando o eufemismo de “conquista”, ignorando de todo o seu pensamento político – se o tiver – e fazendo tábua rasa de todo o seu comportamento e posicionamento como cidadão e como activista.

A natureza de “movimento” esteve sempre na génese e na acção dos nossos dois maiores partidos. Um saco onde cabiam todos os pensamentos e todos os projectos de sociedade.

Enquanto o mais antigo cumprindo a sua tarefa, primeiro, de movimento, depois de movimento armado – absolutamente necessário aos objectivos que perseguia – já se afirmou, em tempo de democracia, como um autêntico partido, o mais novo, passados trinta e um anos após a sua fundação, não obstante o estatuto de partido que formalmente ostenta, ainda tem no seu comportamento e na sua dinâmica todas as características de movimento, o que lhe confere uma enorme permeabilidade e aberta porosidade dando lugar a infiltrações várias, descaracterizando-o com a afirmação de tendências – uma ou outra dominante – que lhe são espúrias.

É neste quadro de descaracterização e falta de identidade própria que um candidato às presidenciais que devia ser natural e apoiado antes da sua candidatura oficial é hoje ignorado pelo partido que fundou, e em seu benefício apenas um envergonhado comentário pessoal do líder desse partido de “bom ou excelente candidato” quando se esperava algo definitivo e conciso previamente anunciado como: “se ele se candidatar é óbvio que tem o apoio inequívoco do partido”. Isto não aconteceu e reflecte a essência de um movimento sem identidade que menospreza os seus próprios militantes. Um movimento que parece não saber de onde vem nem o que é, e, por isso, não pode saber para onde vai ou quer ir.

O facto de as candidaturas presidenciais serem de cidadania e apartidárias não significa que não possam ser apoiadas por forças políticas devidamente organizadas ou partidos políticos.

Quem não se lembra de há cerca de dez anos, sendo líder do movimento um dos actuais protocandidatos, um militante com currículo, porque fora Presidente da Assembleia Nacional, ter sido preterido em favor de um não militante, ou melhor, de um “militante” de uma outra organização política, pelo próprio partido através de uma absurda e descabida encenação?

A situação de então foi bem mais vergonhosa e absurda do que a actual que sugere que “quem com ferros fere com ferros será ferido”.  Esperemos todos que isto não passe de sugestão e que nunca mais volte a acontecer!...

E que não se tenha a peregrina ideia de “inventar” mais um candidato de “peso” e submetê-los de novo a eleições internas dividindo artificialmente o eleitorado.

Ainda está bem patente na memória de todos as consequências de dois proeminentes militantes de um mesmo partido disputarem o mesmo universo de eleitores!

Aprendamos sempre com os erros – nossos e dos outros!...

AF

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