De
vez em quando é tão bom revisitar a escola! Reviver, agora sob forma de boas
recordações, as aulas de Língua portuguesa e de Literatura que ao longo de
quase quatro décadas leccionei em
Lisboa, em Bissau, no Sal e na Praia.
Um
dos assuntos que abordava com os alunos das classes mais adiantadas, era a
distinção de textos. Falava-lhes de textos de opinião, de crónicas, de textos
noticiosos/informativos, de textos criativos, de ensaios, de teses, como formas
diferenciadas de abordar um tema. Lembro-me de levar para as aulas como exemplo, o tema das
Viagens tratado sob vários ângulos e contextos, a saber: crónica, texto
criativo, texto publicitário, ensaio, tese…
Era o exemplo prático apresentado, exactamente
para os alunos perceberem as diferenças na descrição de viagens em que entravam
nuns textos a objectividade, versus a subjectividade em outros.
Na mesma linha, a extensão textual, a análise científica versus a análise
emotiva/sentimental, entre outros parâmetros distintivos de cada uma das formas
de escrita, já devidamente e amplamente classificadas.
Este
intróito e todo este arrazoado foi
apenas um aparte e um desabafo.
E vêm a
propósito de quê? Passo a explicar:
Aconteceu
aqui há algum tempo uma pessoa amiga ter-me contado que havia escutado de um
comentador num programa televisivo nacional, a propósito do Crioulo e da Língua
portuguesa, comparar Artigos de Opinião, com uma Tese académica, no caso, para a obtenção de um grau
académico.
O interessante é que nessa comparação ilógica – insensata e
algo descabida - o Comentador queria mostrar a superioridade da posição
sustentada na aludida tese, face aos Artigos de Opinião, sobre o Crioulo
cabo-verdiano e a Língua Portuguesa
Custou-me sinceramente, saber que um comentador da TCV
nacional, com alguma responsabilidade elocutória e opinativa, não conseguisse distinguir,
diferenciar níveis de abordagens tão diferentes, que não são e nem podem ser equiparados.
Por outro lado, ao fazer-se a apologia de uma tese deve-se
ter sempre em conta que é apenas a assumpção de uma visão de um problema e não
a verdade absoluta e irrefutável sobre ele. …
Infelizmente, por ignorância ou má-fé, não foi o resultado da
conversa televisiva, uma vez que o dito Comentador, acabou por confundir no
mesmo imbróglio por ele criado, “Artigo de Opinião” com “Tese Académica”.
São duas formas de escrita e de descrição bem diferentes, em que
uma, pouco ou nada tem a ver com a outra. embora versando o mesmo
tema.
Ora bem, vamos por
partes, o primeiro, só obriga o seu autor. O Artigo de Opinião, como o próprio
título o define só carreia a opinião do seu autor e as suas principais
características enquanto produto textual, é o lugar que tem nele, a
subjectividade, o seu principal atributo – o pensamento, o sentir, a forma de
percepção do seu autor, na abordagem de um assunto e a circunstancialidade
espacio-temporal que o envolve. Trata-se normalmente de um texto relativamente
sintéctico e curto em termos de sentido e de extensão.
A segunda, a Tese
direccionada para a obtenção de um grau académico. estrutura-se e fundamenta-se
em citações e em comparações de vários e de diferentes autores sobre a matéria
nela descrita e que se destina primeiro como trabalho universitário com vista à sua apresentação, discussão e finalmente, eventual aprovação de um Júri
abalizado e versado no assunto, uma vez avaliada a Tese em discussão final do
candidato ao título académico.
Ora bem, a Tese assim
feita é, em linhas muito gerais, formatada da seguinte forma: coloca-se uma
hipótese sobre um determinado assunto. Reúne-se uma panóplia assisada e bem
fundamentada de teses, de teorias e de ensaios já existentes sobre a matéria em
que aqui já haverá escolhas, selecções e opções do próprio autor de
Tese. Torna-se quase obrigatório um manancial de citações diversas para provar
o trabalho de pesquisa.
Na
mesma linha, numa Tese, deve ocupar lugar distinto o aspecto científico da
matéria em defesa. O autor da tese também pode lançar, por vezes, inovações e
abordagens originais como mais valias para a defesa do seu trabalho final de
obtenção do grau académico almejado.
Quando
muito, em termos de definição de textos, uma Tese estará mais próxima,
comparativamente, de um Ensaio. Mas nunca de um Artigo de Opinião.
Mas é bom que fique claro que uma Tese é para justificar uma
hipótese posta ab initio. É uma visão sustentada de um determinado assunto. Não
são dogmas como pretendeu o comentador E é quase sempre discutível, refutável e,
por vezes, ultrapassada à luz de novas evidências, de novas teorias que
conduzem a novas abordagens que, muitas vezes são do desconhecimento do próprio
júri...
Desculpem-me esta explicação tão primária do assunto – e se
calhar inadequada para o nível do leitor deste “Blog”. – Mas é que fiquei completamente perplexa com a comparação feita por esse comentador atrás citado que devia ter algum cuidado crítico e não argumentar-se em precipitadas e descontextualizadas comparações que o acabaram por levar a conclusões nada intelectivas.
E terá sido assim que a análise televisiva foi feita sem qualquer
sentido lógico textual, acrescentou a minha fonte.
Posto isto, não
resisto a recomendar , que não se confunda e muito menos se compare um “Artigo
de Opinião” – que visa fins e público bem gerais - com uma “Tese académica” orientada
para público e objectivos bem específicos.
E
com esta me fico, pois de confusões textuais estão os nossos meios de
comunicação cheios...
1 comentários:
Penso que esta intervenção da Ondina é muito pertinente e de grande utilidade para o esclarecimento do leitor. Ninguém poderá refutar o seu ponto de vista e argumentação, tão nítido é o absurdo de querer comparar um artigo de Opinião com uma Tese académica. Para mais, é necessário este tipo de esclarecimento porque o leitor ou espectador não pode ser confundido por quem aceda aos meios de comunicação julgando-se de uma infabilidade divina na sua qualidade de comentador.
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