É
obrigação de qualquer governante ter uma mensagem de esperança e de confiança.
Mas esperança e confiança não significam mentira e ilusão.
Quando
se ouve o nosso primeiro-ministro vangloriar-se de que Cabo Verde será um país
desenvolvido em 2030, isto é, dentro de década e meia, pasmamo-nos com tamanha
temeridade na proporção exacta de nos questionarmos não só sobre os dados que
só ele detém e ninguém mais conhece como da necessidade dessas afirmações,
fúteis e gratuitas para além de inoportunas, num momento de crise generalizada.
Ninguém
lhe irá pedir contas sobre aquilo que irá acontecer no ano 2030. Ele sabe-o
bem. Nem se espera, embora se deseje, que neste particular, fosse um
Nostradamus. O que se pretende, e bem nos bastava, é que ele fizesse o seu
mandato com honestidade, seriedade e alguma competência, o que não tem, de
todo, acontecido. Que tome consciência do tempo presente que vivemos que
convida a uma profunda reflexão e alguma contenção nas palavras e nos actos.
Depois
do conhecimento dos documentos do Banco Central e do FMI a inquietação é o
sentimento que ocupa integralmente a nossa mente.
O
discurso triunfalista e arrogante em dissonância absoluta com o País real que
ao longo de toda a sua existência de estado soberano nunca produziu o
suficiente para viver – todos os orçamentos, sem qualquer excepção, foram
co-financiados por instituições ou países estrangeiros – não deveria ser
produzido sem se analisar correcta e criteriosamente a nossa classificação de
país de desenvolvimento médio – porque é que o somos, como lá chegamos e como o
sustentamos. Os resultados a estas análises talvez nos levassem para uma realidade
que não é seguramente aquela que o PM ufana ofendendo todos aqueles que com alguma
renúncia e sofrimento dos respectivos povos ainda nos ajudam.
Com
a mão sempre estendida a pedir, devíamos ter mais cuidado com os nossos
doadores demonstrando com atitudes e comportamentos os nossos agradecimentos e
também compreensão pelos sacrifícios que os seus povos fazem para nos ajudar e se
solidarizarem.
Perante
as previsões verdadeiramente inquietantes do BCV, as elevadas taxas de
desemprego, a desaceleração da economia, o aumento da inflação baixando o poder
de compra dos cidadãos, o eventual crescimento negativo do PIB, o PM responde
dizendo que respeita as previsões do BCV e que vai trabalhar “para que essa previsão não se transforme na
realidade dos factos”.
Acresce
ainda que a nossa dívida global, empresa públicas inclusive, designadamente,
TACV e Electra, é, com todo o respeito pela douta e abalizada mas isolada
opinião da Ministra das finanças em considerá-la sustentável, incomportável
para a nossa produtividade. Mesmo que assim seja a nossa capacidade de
endividamento é verdadeiramente reduzida.
O
que admira e nos deixa perplexo é o facto do autismo do PM e a navegação à
vista do seu Governo que não se compagina com o perfil técnico da sua ministra
das finanças, não ter permitido antecipar às conclusões do BCV e tomar medidas
no seu mais importante instrumento de políticas – o orçamento do estado – que
mitiguem e reflectem as perturbantes previsões e conjecturas do BCV e do FMI.
Governar bem é adiantar-se aos acontecimentos e às circunstâncias.
As
previsões são isso mesmo: previsões. Nada mais! Os comentários do PM em como
não se podiam transformar as projecções em dados macroeconómicos sendo “lapalicianas” reflectem isso mesmo. Mas
apesar disso, nenhum país, nenhum governo, nenhuma instituição financeira
prescinde delas.
O
que se esperava de um governo sério e atento e de um PM minimamente competente
é que dissesse “não concordo com elas. As nossas (as previsões) apontam para
outros valores e não há razões para os alterar” e os indicava. Ou então, “as
previsões do BCV já se encontram reflectidas no Orçamento do Estado”. Dizer apenas
que ia trabalhar “para que essa previsão
não se transforme na realidade dos factos” o que sendo um gesto de aparente
humildade intelectual é, também, sinal inequívoco de que o orçamento do estado
não fora elaborado sob estas bases o que também relega para mais explicações
sobre as eventuais derrapagens e as medidas a tomar.
Mas
inquietante e perturbante também é o facto de não se vislumbrar um movimento, um
gesto, um comportamento, uma atitude da parte do PM que se oriente na
concretização das suas palavras.
O
esbanjamento continua com viagens – uma parte bem significativa – meramente recreativas
a todos os níveis, ministérios virtuais porque desnecessários e inseridos numa
estrutura sobredimensionada, e infra-estruturação eleitoralista porque não
prioritária sobretudo em circunstâncias de exagerado endividamento e a maior
parte – das infra-estruturas – de reduzidíssima taxa de rendibilidade interna,
o afundanço do importante sector da construção civil gerador de empregos.
Longe
vão as promessas do desemprego a um dígito apesar da sua criatividade
estatística, do crescimento a dois dígitos, ou do 13º mês. Isto sem mencionar o
perigo que corre o Acordo Cambial com os elevados e continuados défices
orçamentais.
Os
actuais e contínuos atrasos nos pagamentos aos reformados e pensionistas, coisa
nunca dantes vista, mesmo nos piores momentos do País e com a extensão e
solidez que se estão a configurar, é sinal inequívoco de que as coisas não vão
bem.
Por
isso basta de triunfalismos pueris e bacocos e de mentiras impiedosas e
maquiavélicas. Basta de torturar os números para que falem de acordo com as
conveniências. Temos todos, o direito de saber com realismo a quantas andamos.
E pelo andar da carruagem, é (era) já tempo de apertar o cinto. O Governo que
dê o pontapé de saída.
A. Ferreira
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