1.Uma coisa que me chamou atenção nos períodos da pré-campanha e campanha foi a quantidade de cartazes gigantes (outdoors) espalhados na capital. Muitos pareceram-me publicidade desnecessária, outros enganosa e outros ainda absurda. Havia-os por todo o lado dos dois grandes partidos à mistura com os comerciais. São artefactos caros sobretudo quando feitos em pequena escala. E a maior parte não resiste a uma análise custo-benefício, ainda que superficial. A transposição de métodos de publicidade comercial para o marketing político exige ponderação, critério e alguma expertise. Toda a publicidade tem uma meta, visa um objectivo e tem um retorno. Mesmo a política.
2.Apanhei-me a imaginar de onde viria tanto dinheiro para os partidos brincarem aos cartazes gigantes, aos outdoors. Sim, porque a sua profusão era tanta que de outra coisa não podia tratar-se. Além do mais, estranhou-me a quebra de uma regra de ouro no marketing político: “evitar a multiplicidade de mensagens e centrar num número reduzidíssimo e de forte conteúdo.
3.Admiti que, eventualmente, algum lobby publicitário bem instalado, quiçá por mero oportunismo, aconselhava a este tipo de marketing. E não seria necessário que ocorresse simultaneamente nos dois partidos. Bastaria que se instalasse num só, que a lei da acção-reacção faria o resto. Mas o que me intrigava particularmente, é a sustentabilidade deste tipo de publicidade de tal forma onerosa que até vem sendo afastada por partidos europeus em campanha brandindo expressamente essa exclusão como bandeira de austeridade.
4.Uma ponta do véu se me levantou quando tive oportunidade de ler algures que “O MPLA considera, num documento interno, “exitoso” o apoio material ao PAICV para a sua recente campanha eleitoral”. Não foi surpresa nenhuma dado os rumores que sobre o assunto por todo o lado intensamente circulavam. Apenas confirmação. E aí condescendi: não custa esbanjar o que os outros “trabalharam” ou, melhor, conseguiram.
5.Embora tenha alguma reserva se é moralmente aceitável o apoio dado por entidades estrangeiras a partidos políticos nacionais para campanha, não posso deixar de admitir que é uma prática entre partidos da mesma família e afins e que seria de todo impossível evitá-lo. Acho, contudo, que vicia sobremaneira as regras do jogo sendo por isso de elementar honestidade e transparência que, no mínimo, esses “apoios” fossem obrigatoriamente declarados e posteriormente contabilizados (sem criatividade) como se faz em todos os países democráticos sérios e a sério. Muita especulação se evitaria e muita transparência e credibilidade ganharia a ambiência política, e abrir-se-ia a compreensão para certas e/ou eventuais contrapartidas.
6.Sobre o MpD ainda paira sobre mim o desconhecimento da origem do dinheiro desbaratado em alguns outdoors. Não descarto a eventualidade de também ter recebido apoio do exterior. Só assim se compreende a utilização abusiva desta via onerosa mas efectivamente cómoda de fazer campanha, dando respaldo, como se viu, à falta de um trabalho árduo, penoso e continuado no terreno.
7.Voltando aos cartazes, não os vou comentar todos, mas registo que alguns deles eram portadores de conteúdos de tal forma fúteis ou visivelmente falsos que não só não justificavam o investimento, como produziam pernicioso efeito boomerang, de retorno – desconfiança e perda de credibilidade – bem ao contrário do pretendido.
8.Lembro-me de um – do MpD – que ilustrava o rosto de um jovem e dizia, mais ou menos, isto (cito de cor): “A minha bolsa, onde está a minha bolsa?” No mínimo pareceu-me absurdo alimentar este tipo de ilusão tanto mais que se tratava de um partido que defende o mérito (parece que todos o defendem) e preconiza a diminuição do peso do estado na sociedade e na economia do País. A bolsa de estudo é simultaneamente um prémio de mérito e um investimento. Com regras claras, obviamente. E fazer dela um direito é uma absurda e insustentável demagogia e por isso, descredibiliza e desacredita.
A política tem que ser feita com verdades e transparência.
9.Um outro – do PAICV – referindo-se às realizações do governo que sustentava, não teve pejo em falar, de entre outras enganosas como a criação de inúmeras universidades (imagine-se!...) privadas, do Aeroporto da Praia como também sua. É espantosamente enganoso!...
10.O Aeroporto da Praia é uma história longa que vem dos fins dos anos 80, atravessa os 90 chegando a 2000. Não é mérito de nenhum partido ou governo. Conheço razoavelmente a história da qual fui, circunstancialmente, também protagonista. O Aeroporto da Praia não é uma concepção estratégica do governo do MpD que o iniciou nem do PAICV que o finalizou. A atribuir paternidade ao Aeroporto da Praia só há um nome: Osvaldo Lopes da Silva. Singularmente. Faça-se-lhe justiça antes que a mensagem insinuada no outdoor a reescreva como história oficial. Foi ele que o concebeu como medida estratégica para o desenvolvimento de Cabo Verde e foi graças à sua perseverança, “teimosia”, convicção de que era mesmo estratégico e remando contra ventos e marés “impôs” o Aeroporto da Praia. A tese então dominante era que com a construção do Aeroporto da Praia, o do Sal e mesmo a própria ilha desapareceriam social e economicamente. Não vou recontar a história. Penso que os menos jovens suficientemente informados ainda se lembram que à revelia do seu próprio governo, o então Ministro dos Transportes ousou, usando uma prerrogativa de tutela “enterrar” fundos da ASA nas fundações (aterros) do que viria a ser o Aeroporto da Praia. Foram milhões de dólares, que criaram um facto consumado e levaram o governo do MpD, que logo a seguir assumiu o poder, a institucionalizar o Projecto, negociar o financiamento e promover todas as diligências que permitiriam o lançamento da 1ª Pedra pelo Presidente Mascarenhas Monteiro na segunda metade dos anos 90. Não está em causa se o Aeroporto da Praia seria mais cedo ou mais tarde construído. Hoje – é fácil dizê-lo - estamos todos convencidos que sim. Mas neste momento apenas pretendo colocar o assunto num referencial temporo-espacial, devidamente definido. A História não se faz com “se” mas sim com factos.
11.Retomando outra vez os outdoors, salvo opinião mais abalizada, não acredito que eles sejam a melhor forma de investir na campanha política mas sim de gastar dinheiro. E o dinheiro não se gasta, utiliza-se. Não quero com isto dizer que são de todo inúteis. E não sou contra cartazes, entenda-se. Sou sim, pela sua absoluta racionalidade como instrumento de marketing político. Mas não creio que sejam eficientes fazedores de opinião.
12.Agora que as eleições terminaram e os resultados conhecidos é tempo de balanço, do deve e haver, como sói dizer-se. O PAICV não constitui preocupação - ganhou as eleições com um número significativo de votos e está bem escorado financeiramente na generosidade estratégica de alguns membros “poderosos” da sua família política. Está, portanto, visto, que do lado das despesas nenhum partido em Cabo Verde pode competir com ele. Os presidenciáveis sem o seu apoio que se cuidem.
13.Quanto aos outros, sobretudo o MpD, é necessária (seguramente que estará a fazê-la) uma avaliação séria e objectiva do desempenho político do partido não só durante a campanha mas ao longo de toda a legislatura. Não aquelas avaliações normalmente “especulativas” (sem um estruturado documento-base) e cheias de retórica das Comissões Políticas. Mas de uma avaliação precedida de um diagnóstico profundo, sério e honesto feito pelo Gabinete de Estudo ou algo com funções semelhantes (se não existe devia existir) e submetido à Comissão Política e demais órgãos do partido para apreciação e propostas. Não será apenas de uma circunstância (campanha) mas também de um período longo de jejum. Mérito do partido no poder ou demérito da oposição? Uma avaliação com recolha efectiva de dados e o seu adequado tratamento; que determine as causas do desaire eleitoral; que estabeleça os planos, as metas e os objectivos; que permita a (re)estruturação e a (re)organização do partido; que promova o alargamento e a fidelização da sua base de apoio; e que aponte já, o rumo a seguir. Os planos ajustam-se no decorrer da acção. Mas é preciso existir um e é preciso haver acção. Os políticos não são funcionários, são “missionários” no sentido literal do termo. São para servir e não para se servirem. Ou se disponibilizam seriamente ou abdicam.
14.Como alguém escreveu neste blog:”Para já o MPD o que mais tem é tempo para mudar.”
A.Ferreira
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