Sempre
me preocupou a nossa presunção de modernismo proclamada aos quatro ventos como
se fôssemos realmente suficientemente autónomos para decidir sobre todas as
nossas pretensões.
As
nossas leis são sempre as mais modernas e os nossos Códigos dos mais avançados
sem nos atermos com a devida atenção na nossa sociedade, isto é, nos
verdadeiros impactos que irão ter nela como tal e como conjunto de indivíduos.
Numa palavra, se ela, a sociedade, é também das mais avançadas?
É
óbvio que estou de acordo que devamos nivelar por cima, mas estou muito mais de
acordo com a procura de condições para assim proceder.
Compreendo
a ufania dos legisladores e interrogo-me sobre o que aconteceria aos nossos arquitectos
e engenheiros se andassem por aí a projectar arranha-céus, grandes barragens, caminhos-de-ferro,
grandes embarcações, palácios sumptuosos, enormes e aprazíveis parques de
diversão, estádios esplendorosos, etc. etc.; ou a polícia a exigir carros bem
equipados, tecnologias de ponta, das mais avançadas do mundo, laboratórios
científicos bem apetrechados e gente superpreparada para garantir a segurança e
a protecção do cidadão e fazer jus às modernas leis e aos avançados códigos?
A
resposta com certeza seria, ou estaria muito perto de: “estes tipos pensam que
estamos na Suécia ou na Suíça? Ainda não atinaram que estamos em Cabo Verde, um
estado minúsculo e pobre?
Falou-se
já de salário mínimo. Fez-se dele durante muito tempo uma bandeira, quase
desígnio nacional, sem se preocupar se ele geraria mais empregos, promoveria
mais riquezas ou traria melhores condições de vida ao cabo-verdiano. A poderosa
Alemanha não tem salário mínimo enquanto a Bulgária tem um ridículo salário
mínimo de cerca de 6.000$00 (56 Euros). Isto apenas para citar duas situações
extremas da rica União Europeia.
Hoje
está sobre a mesa o subsídio de desemprego. Não deixa de ser interessante que
isto acontece quando a Europa que nos ajuda, luta desesperadamente com a sua
permanente diminuição, o seu encurtamento e alguns países só não o extinguem porque
se trata de um direito adquirido num continente modelar em direitos sociais.
Ninguém poderá estar em desacordo se houver capacidade para o sustentar. Mas num
país de desempregados importaria muito mais falar de geração de emprego. A
falta de emprego é que humilha, avilta, amesquinha e destrói. Não me parece que
o subsídio - uma medida paliativa porque sempre limitada no tempo - combata
esses danos morais e psicológicos, entre outros. Dir-me-ão: Mas mitiga!
E aí
interessa saber o seu verdadeiro impacto social, a dimensão da sua projecção no
tempo e se não põe em causa hoje, mas sobretudo, no futuro, a frágil sustentabilidade
da segurança social no País. Como habitualmente, escolhe-se sempre a via mais
fácil sem olhar ao seu custo.
Todas
essas preocupações poderão ser, abstractamente, justas. Mas serão elas próprias
geradoras de riqueza e de diminuição da taxa de pobreza? Foram medidas as suas
consequências de curto, médio e longo prazo?
Outra
questão que se tornou uma fixação é a criação de um Tribunal Constitucional
não acoplado ao STJ e da Provedoria de Justiça.
A solução actualmente existente quanto ao Tribunal
Constitucional não é, de todo, uma cabo-verdura. Ela existe em países
democráticos como os Estados Unidos da América – o Supremo acumula as funções
do Constitucional. Porquê procurar uma solução mais dispendiosa, criando
estruturas, a meu ver, puramente parasitárias dado o volume de trabalho que não
terá? Ou será, como diriam alguns, para servir uma certa clientela, sem
quaisquer garantias do acréscimo de eficiência ou mesmo de isenção? Será ela (autonomia)
uma prioridade num país que se debate com enormes problemas socioeconómicos e
com uma efectiva necessidade de um acérrimo combate à miséria?
Se a actual configuração não dá resposta satisfatória não
nos enveredemos por soluções fáceis que sejam onerosas. Procuremos com estudo e
reflexão as suas fragilidades e tentemos corrigi-las com um mínimo de acréscimo
de esforço para o erário. Reflictamos maduramente sobre isso!
E quanto à figura de Provedor de Justiça, qual será
realmente a sua força para conter os eventuais desmandos, que os há, do
Governo? Não seria preferível que os partidos políticos, sobretudo os do
sistema ou da esfera governativa como se tornou moda dizer-se, abrirem mãos do
sufoco, do controlo excessivo que exercem sobre a sociedade civil, atendendo-a
e deixando-a crescer e implantar-se livremente, sem a tutelar? Isto passaria
irremediavelmente por uma análise profunda e, eventual, reforma do nosso
sistema político apontando para que os partidos abrissem mão do monopólio que
indubitavelmente têm da actividade política e permitissem que o “indivíduo”
fora do espaço partidário pudesse também participar de forma activa na vida política
do País para além do acto de votar. Não há que ter medo: os partidos serão sempre
essenciais à democracia.
Não
podemos, por puro mimetismo, cultivar vaidades e veleidades e depois estar de
mãos estendidas a pedir que no-las alimentem de forma directa, ou indirecta
através do orçamento do Estado. Estas devem-se apoiar apenas e unicamente nos
nossos recursos.
Sempre
vivemos à custa de doações e subsídios e devíamos ter mais atenção e contenção com
o dinheiro daqueles que nos ajudam.
A
procura de sinergia é uma regra de ouro. No nosso país, pequeno e arquipelágico,
é um imperativo. Tal como o cálculo custo-benefício e financiamento interno ou
externo se for questão de sobrevivência.
É por isso que quando me falam de Tribunal Constitucional
não acoplado ao STJ e Provedoria de Justiça, eu questiono muito sinceramente da pertinência
da sua prioridade.
Essas temáticas assim como outras que visam criar
estruturas e mais estruturas num país que nunca produziu riqueza suficiente –
essa é a grande verdade; veja-se o financiamento do OGE – para a sua manutenção,
poderão constituir uma interessante e vistosa imagem da nossa democracia
formal, mas no concreto não representariam uma efectiva e palpável melhoria de
vida dos nossos concidadãos.
É preciso pôr a tónica naquilo que é essencial para a
melhoria efectiva da qualidade de vida dos cidadãos e não naquilo que serve mais
aos partidos e ao sistema do que aos cidadãos, individual e colectivamente.
A. Ferreira
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