Em prol da Língua portugesa...

domingo, 3 de maio de 2015

“Água mole em pedra dura...” ao bom entendedor meia palavra apenas.

A Língua portuguesa é actualmente o elo mais fraco da cadeia linguística cabo-verdiana.

É triste e deprimente para a nossa cultura, observar como os predadores da riqueza linguística cabo-verdiana têm vindo a actuar, a fazer opinião, e infelizmente, a ganhar terreno.

Para mal dos nossos pecados são pouquíssimas as vozes que se levantam abertamente contra tal estado de coisas e assumidamente a favor da expansão, da oralidade e da permanência da nossa também, língua portuguesa.

 Por outro lado, atira-se aos quatro ventos que o que se pretende é o bilinguismo.  Puro engano!  Como tal será, ou seria, possível se nada, mas mesmo nada, se diz e se faz neste país, em prol da Língua portuguesa?

A questão linguística cabo-verdiana tornou-se num reduto, onde só entram  ou apenas estão autorizados a penetrar, por “motu próprio”, os ditos “especialistas” e as aspas aqui não se dirigem tanto à capacidade técnica dos mesmos, mas mais ao exclusivo no tratamento das línguas por eles pretendidos.

A questão linguística é muito mais abrangente; ela é pertença dos seus falantes. Deus nos livre e guarde!  - deixar esta transcendente questão, que é de todos os cidadãos cabo-verdianos, apenas nas mãos totalitárias de um punhado de linguistas, sociolínguistas e políticos, alguns de duvidosos gosto para uma actuação descomplexada.

 Existe, de facto, uma defesa exacerbada - sem muita razão de ser nos tempos que correm - do Crioulo, como se este não estivesse pujante e cheio de vitalidade na fala do cabo-verdiano. O que é necessário e urgente é a preservação e a expansão da nossa língua segunda e oficial, em todas as ilhas e sobretudo, nos meios que lhe são naturais, como a escola, a administração pública e a comunicação social.

O assunto já assumiu contornos de prós e de contras. Tal é a confusão que por aqui vai!!...

Os responsáveis lançam diplomas sobre diplomas, fazem encontros, sobre encontros, oficinas de trabalho, e conferências, e mais mesas redondas, eu sei lá!... nenhum é sobre a Língua portuguesa. Vai tudo na defesa (como se ainda estivessemos na posição de há 40 anos atrás!) do Crioulo e ninguém reflecte, ou quer reflectir, meditar, analisar sobre o que vem sucedendo ao português nestas ilhas tendo até em conta a comunidade linguística à escala global a que pertencemos.

 Estamos em 2015! Quatro décadas, duas ou mais gerações já nos separaram de 1975 (ano da independência)!

 Começa a ser fastidioso e saturador “bater” na tecla do antigo problema do não prestígio do Crioulo e da mais-valia do português entre nós. Este pressuposto, obviamente,  nunca existiu para a geração que tem hoje quarenta anos. A que cresceu,  viveu e ainda vive com a independência de Cabo Verde não pensa, nem pode pensar, assim, a não ser  em situações muito pontuais por influência de um ou outro, eventual encarregado de educação, naturalmente, mais velho. Afinal,  a  geração mais nova estava de “alma lavada”!

 O que a geração dos nossos filhos e netos, se apercebe e talvez deseje ver implantado, não à força, mas num fluir natural e evolutivo do mundo global em que estamos inseridos e do qual dependemos e interagimos, é o tal bilinguismo, já bastas vezes apregoado, mas que infelizmente tem sido mal construído, porque á custa do mal-dizer e do prejudicar a co-existência  do crioulo com a língua portuguesa.

 Meditemos sobre o modo como o processo tem vindo a ser conduzido.  Vejamos qual será o presente e o que virá no futuro da Língua portuguesa - nossa também e de pleno direito? Como usufruir, e bem, deste rico legado linguístico, histórico e cultural, a tal primeira língua que os pássaros, as rochas e o mar ouviram nestas ilhas? Que devir, entre nós desta riqueza de comunicação que tem tido um papel ímpar no desenvolvimento do país?

Há dias comentava (meio a brincar, meio a sério) com uma pessoa amiga de que no dia em que um Partido eleitoral nacional, apresentar no seu programa de governação, uma proposta de cuidar da Língua portuguesa nestas ilhas, de tentar recuperá-la e expandi-la, entre nós, a boa oralidade da nossa língua segunda e oficial; esse hipotético programa  de governação, terá o meu voto e os votos também, se calhar, da maioria silenciosa dos cidadãos cabo-verdianos a este respeito. Até faria diminuir a abstenção que vem conhecendo um crescendo, sem paralelo nas eleições de há  década e meia!

Infelizmente, com estas manobras de  configuração destrutiva, já  se conseguiu derrubar o último ambiente próprio e adequado da língua portuguesa em Cabo Verde que é a escolarização, o ensino, para muitos, a única oportunidade que significativa parte das criança e dos adolescentes destas ilhas, tinha para o contacto com a língua oficial do país!

Não devemos misturar os papéis que às duas línguas foram por nós, seus falantes, cometidos, num trabalho pacientemente elaborado há séculos. Sempre os soubemos distinguir e ao que parece isso tem contribuído e bem para o desenvolvimento do país. Por favor! Não concorram para o empobrecimento tecnológico, científico e cultural de gerações vindouras.

Tudo isto desestabiliza, vem perturbando seriamente e sobremaneira o ensino e a aprendizagem dos alunos.

Na minha opinião reiterada, as duas línguas nacionais têm papéis distintos no edifício  bilingue, pretensão bem-vinda, que o falante cabo-verdiano quer ver efectivado. Misturá-los e confundi-los será péssimo!

Um dado interessante: o Observatório da Língua portuguesa, para além de registar que este idioma é o que mais vem crescendo em Angola, Moçambique e São Tomé e Príncipe, nos últimos quarenta anos, sendo que no primeiro país mencionado – Angola –  a sua expansão é  exponencial  sendo já língua materna   de quase cem por cento dos nascidos em meios urbanos e no pós – independência; registou também que o Parlamento Europeu declarou recentemente, a Língua portuguesa como a terceira língua de comunicação europeia.

Ora se pensarmos que nos últimos anos, levas e mais levas de jovens cabo-verdianos saem do país em demanda de trabalho e de dignidade em Angola e em outros países de acolhimento e de língua portuguesa, isto para não falar que Portugal vinha registando estatisticamente, a comunidade cabo-verdiana, como a comunidade imigrada mais numerosa no seu seio, com forte crescimento depois da independência do Arquipélago e até sensivelmente, meados dos anos noventa do século XX, altura em que foi ultrapassada pela oriunda dos países do chamado Leste europeu; se adicionarmos a tudo isso o papel comunicativo que o português tem para esta nova geração de emigrantes  para a sua integração no meio de acolhimento, mais valor e cuidado estaríamos a atribuir à língua portuguesa no ensino em Cabo Verde.

Deixemos de pseudo-patriotices bacocas! Pensemos objectivamente, nos ganhos, nos benefícios que temos tido e que continuaremos a ter, se à Língua portuguesa for reconhecida o mérito incomensurável que tem tido no desenvolvimento a todos os níveis de Cabo Verde.

 

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