Com a
devida vénia ao autor, tomámos a liberdade de publicar este texto que aborda a
importância que hoje é dada à qualidade da educação, nas instituições de
ensino.
A
educação é o motor das Sociedades
Por:
Nuno Crato*
Ficamos
contentes com o aumento da escolarização – e é justo que isso se faça. Mas
poucas vezes pensamos na qualidade da educação. Que aprendem de facto os nossos
jovens?
Há
muitas décadas que se discute se a educação pode mudar as sociedades e, em
particular, se é causa do crescimento económico. A resposta afirmativa era
quase um dogma até que alguns sociólogos questionaram se não seria o contrário,
se não seria o crescimento económico que permitiria a criação de um melhor
sistema educativo.
Se foi
o ovo se foi a galinha tornou-se um puzzle em que se digladiaram vários
estudiosos. Os estatísticos não conseguiam sequer evidenciar a existência de
uma correlação entre os indicadores educativos e o crescimento. As coisas
mudaram na transição de século, quando alguns economistas de educação, um campo
de estudo que começou a surgir, começaram a estudar outros indicadores. Em vez
de estudar a escolaridade média da população, o número de estudantes, a redução
do abandono escolar, a média de horas passadas na escola, o número de graduados
e outras estatísticas, passaram a estudar indicadores cognitivos, isto é, o que
os estudantes e os jovens tinham aprendido. Esta mudança tornou-se possível
pela realização de inquéritos internacionais de larga escala, tais como os
estudos PISA e TIMSS. Em termos simples, as coisas mudaram quando em vez de
analisar a educação pela quantidade se passou a analisar a educação pela sua
qualidade.
Os
dados mostraram aquilo que até então tinha resistido à análise estatística. Ou
seja, os dados de qualidade de educação explicam parte significativa do
crescimento económico. Tudo indica que a qualidade da educação – não a sua
quantidade – é importante fator de desenvolvimento.
Passaram
quase três décadas desde que essa descoberta estatística começou a ser
evidenciada e sucessivamente confirmada. No entanto, muitos de nós ainda
pensamos em termos de quantidade. Ficamos contentes com o aumento da
escolarização – e é justo que isso se faça. Ficamos contentes por saber que há
menos jovens a abandonar os estudos – e também é justo que isso aconteça. Mas
poucas vezes pensamos na qualidade da educação. Que aprendem de facto os nossos
jovens?
Quando
olhamos a educação nessa perspetiva, os dados recentes não nos devem
satisfazer. Mais, devem-nos preocupar. Desde 2016 que todos os inquéritos
internacionais aos conhecimentos e capacidades cognitivas dos nossos jovens
mostram um declínio grave. As médias baixaram – e desde antes da pandemia – , e
o número de jovens com deficiências cognitivas graves a matemática, leitura e
ciências aumentou. E aumentou para níveis preocupantes. Cerca de 30% dos nossos
jovens de 15 anos têm hoje um baixíssimo desempenho em matemática. Cerca de 23%
dos mesmos jovens têm dificuldades extremas de leitura. Ou seja, uma
percentagem grande dos nossos futuros adultos tem o seu futuro comprometido.
Não nos deveria isso preocupar?
Perante
esta realidade, há sempre coisas bonitas a dizer: tornar o ensino mais
interessante, acelerar a digitalização, introduzir jogos nas escolas… pode não
fazer mal…, mas não vai resolver os problemas. Enquanto as políticas públicas
não regressarem a um tripé de medidas comprovadas, nomeadamente um currículo
ambicioso, uma avaliação rigorosa e um apoio estruturados aos jovens com mais
dificuldades, enquanto isso não acontecer, o progresso não se registará. E é
possível fazê-lo? Sem dúvida! Foi o que fizemos desde princípio deste século
até 2015, ano em que obtivemos os nossos melhores resultados de sempre nos
inquéritos internacionais. Atentemos nesses anos e atentemos nos erros que de
2016 a esta parte se fizeram.
*Professor-Investigador e antigo Ministro da Educação de Portugal.