Por João Ribeiro de Almeida[ii]
Festejar
uma Língua, na passagem de mais um 5 de maio, Dia Mundial da Língua Portuguesa
(DMLP), é também refletir sobre a melhor forma de a potenciar, divulgar e
ensinar e de a pôr, cada vez mais, ao serviço das comunidades, seja daquele
grupo já de si com ligações ao universo da lusofonia, os portugueses e
lusodescendentes espalhados pelo mundo ou os cidadãos da CPLP, seja
disponibilizando ferramentas adequadas e suficientes para todos aqueles que
dela se acercam pela primeira vez ou que a queiram estudar de forma mais
estruturada e profunda, nos diversos níveis e modalidades de ensino. E hoje, o
português é já ensinado em 76 países, em cinco continentes.
Tendo
o Camões – Instituto da Cooperação e da Língua (Camões I.P.) como um dos
vetores da sua missão a promoção em sentido amplo da Língua Portuguesa (LP) no
plano externo, em articulação com as nossas redes diplomáticas e consulares e
com o concurso ativo das diferentes estruturas do Camões I.P. no mundo,
nomeadamente, das coordenações de ensino (11 em 18 países), dos centros
culturais (19), dos leitorados (51), das cátedras (perfizemos no final de 2021
as 60 em todo o mundo), dos centros de LP (83) e da rede de docentes por nós
apoiados em 303 universidades espalhadas pelo mundo, é com júbilo, mas também
com especial responsabilidade, que vemos chegar esta data de 5 de maio,
dedicada pela UNESCO (em finais de 2019) ao nosso idioma, consagrando-lhe um
Dia Mundial.
Tratou-se
da primeira vez, nunca será demais referi-lo, que o sistema das Nações Unidas
aceitou “atribuir” um dia mundial a uma língua que não é (ainda) idioma oficial
do organismo, se bem que o português já seja língua de trabalho em diversas
instituições onusianas.
Por
outro lado, é absolutamente necessário que multipliquemos esforços conjuntos
com todos os parceiros da CPLP para melhor otimizar a nossa língua em cada
canto do mundo e para melhor cooperarmos em países terceiros em prol do nosso
idioma. Foi precisamente a circunstância de falarmos um idioma comum que esteve
na génese da criação desta comunidade e esse deve constituir motivo para nos
organizarmos para melhor a promover, fomentar e salvaguardar. Como língua
pluricêntrica que é, o português está em especiais condições, até
geoestratégicas, para contribuir para os consensos, para a construção de pontes
e assim estar ao serviço do diálogo e da paz, sobretudo nos conturbados e
preocupantes momentos por que passamos.
Se
observarmos bem, não existe qualquer continuidade territorial entre cada um dos
estados-membros da CPLP, ou seja, não há fronteiras terrestres entre países
desta comunidade, pelo que foi o mar que levou a língua a todos e a cada um
desses territórios (todos eles, por sua vez, também costeiros) e foi esse ativo
comum que depois nos uniu. Esse mar que faz parte do nosso código genético e
que foi absolutamente determinante na difusão e multiplicação da LP. Refiro
isto a dois meses da realização em Portugal de uma importante Conferência dos
Oceanos das Nações Unidas, sabendo quanto os oceanos foram instrumentais para a
difusão da nossa língua, como foram aliás determinantes para moldar a nossa
vida coletiva em muitas outras vertentes.
E
aqui chegamos a um ponto que julgo de suma importância: tornar a LP cada vez
mais uma língua de ciência e de conhecimento, de investigação e de saber. Numa
altura em que, por exemplo, a produção e a publicação científica estão, de
sobremaneira, dominadas pela língua inglesa (e, lamentavelmente, tenho de o
dizer, alguns estabelecimentos de ensino superior do universo CPLP contribuem
para isso, impondo muitas vezes essa língua aos seus estudantes, graduados ou
doutorandos para os seus trabalhos), cabe-nos a todos refletir sobre a melhor
forma de potenciar a LP neste importante e muito competitivo universo do
conhecimento. São aí importantes todos os contributos destinados a reforçar a
presença da LP em publicações internacionais de referência e em revistas científicas
de alcance global e acesso aberto, do mesmo modo que o são aqueles que se
destinem a reforçar a presença da LP na internet (onde já é a mais falada no
hemisfério sul, pelo que temos pergaminhos nessa matéria). Uma e outra
constituem áreas indispensáveis, até para construirmos (ou pelo menos
contribuirmos) para um mundo melhor. Formar melhores e mais bem informados
cidadãos também é uma prioridade dos agentes de divulgação de qualquer língua e
o português tem de estar ao serviço da cidadania e, portanto, num combate
permanente contra o obscurantismo, lutando contra todos os tipos de populismos
e intolerância. Infelizmente, uma língua também poderá ser instrumento de
disseminação destas realidades.
A Língua Portuguesa é um ativo
global. Os indicadores são conhecidos: é uma língua hoje falada por mais de 260
milhões de pessoas nos cinco continentes (em 2100 serão mais de 500 milhões,
segundo estimativas das próprias Nações Unidas, com um crescimento
impressionante em África), o que equivale a 3,7% da população mundial.
Uma
língua ao serviço dos cidadãos. Uma língua dinâmica, para aproximar povos e
comunidades (hoje já é língua oficial e/ou de trabalho em 32 organizações
internacionais e está num crescendo também nesta vertente, reflexo igualmente
do primado do multilateralismo nas nossas relações internacionais), sem
esquecer nunca a interação fundamental com as comunidades portuguesas e
lusodescendentes, sobretudo na Europa, América e África.
A
Língua Portuguesa é um ativo global. Os indicadores são conhecidos: é uma
língua hoje falada por mais de 260 milhões de pessoas nos cinco continentes (em
2100 serão mais de 500 milhões, segundo estimativas das próprias Nações Unidas,
com um crescimento impressionante em África), o que equivale a 3,7% da
população mundial. As nove economias da CPLP, em conjunto, valem cerca de 2,7
biliões de euros, o que faria deste grupo a sexta maior economia mundial, se se
tratasse de um só país (FMI). Os países com idioma oficial português
representam 3,6% da riqueza total do mundo, 5,48% do global das plataformas
marítimas, 16,3% de disponibilidade global de reservas de água doce (10.8
milhões de km2) e isto são apenas alguns dados que espelham bem como a LP pode
também ser um instrumento de paz em sentido amplo que inclua vertentes incontornáveis
como a proteção ambiental, a árdua luta contra as alterações climáticas (somos
todos, os de língua portuguesa, países costeiros e alguns insulares, portanto
bem mais vulneráveis ao aumento do nível do mar, por exemplo), a favor da
economia circular e cada vez mais verde, etc.
Temos,
pois, como desígnio comum cuidar cada vez mais da nossa língua e da sua
internacionalização. Todos somos chamados a cumpri-lo e não apenas o Camões IP
e/ou a CPLP. Cada um de nós, no nosso dia a dia, pode estar ao serviço desse
objetivo pelo simples facto de falar, de comunicar, de escrever, de criar e
reforçar sociabilidades que nela assentem, seja nas relações interpessoais,
seja no plano digital.
E
é isso que importa continuar a fazer. A tornar a língua portuguesa uma grande
língua de comunicação internacional, com a qual o mundo conta para se construir
e se reinventar de uma forma positiva e inclusiva.
[i] In “Diário de Notícias” de
05.Maio.2022
[ii] Embaixador
Presidente do Conselho
Diretivo do Camões IP – Instituto da Cooperação e da Língua