POR ONDE ANDAM OS CONSELHEIROS DO PM DE CABO VERDE?

domingo, 3 de novembro de 2013
Alguns assuntos que aparentemente não têm interesse de maior ganham certa dimensão quando observados de determinados ângulos.
 
Vejo amiúde o PM do meu País na TV e desagrada-me a frequência com que aparece para tratar de assuntos verdadeiramente menores em tom de voz nem sempre agradável e amistoso. Parece que o governo é só ele e que não tem nenhum colaborador com gabarito para ser porta-voz dos assuntos relativos a esse órgão de soberania.
Preocupante foi mesmo, vê-lo a ler e a comentar as posições e as respectivas variações de Cabo Verde no ranking do Banco Mundial expresso no seu Relatório Doing Business 2014. Embora o tom de voz não fosse “comicieiro”, nem o assunto fosse tão despiciente, não me parece que merecesse uma conferência de imprensa do PM e muito menos para justificar a ausência de uma ministra numa reunião da Comissão Europeia, como acabou por acontecer, depois de a própria já o ter feito publicamente. Não há um porta-voz?
 E sinceramente, ninguém sabe ou imagina o que tem o PM em mente quando fala da nova zona monetária. Um projecto da superpotência regional Nigéria de há mais de 20 anos para países da CEDEAO fora da UEMOA na procura do comando de uma moeda “forte” para fazer frente à desta última (UEMOA) que se encontra indexada ao euro através da França. Um aspecto da estratégia hegemónica da Nigéria – uma pretensa espécie da Alemanha no Euro – que ele, PM, parece agora agarrar como se fosse coisa nova e constituísse a resolução dos nossos problemas futuros.

Uma moeda “comum” ancorada em economias com recursos, graus de desenvolvimento e estruturas organizativas bem diferentes e inserida na mais pobre, desestruturada e militarmente intervencionista comunidade económica do mundo com a agravante para o caso do nosso país, da acentuada descontinuidade territorial (interpondo-se a UEMOA/EURO) factor que dissipa uma eventual sinergia económica. O exemplo de Portugal e os debates sobre o assunto poderão permitir, mutatis mutandi, tirar-se as devidas conclusões.
Ao estabelecer o horizonte de 2020 para a entrada em circulação dessa moeda ele contradiz-se com o estudo que anuncia realizar que o poderá, estou convencido disso, desaconselhar de todo. Ou então esse estudo é apenas um pró-forma, uma vez que a decisão já está tomada. Seria muito grave.

De todo o modo esperemos todos que o PM contenha o seu entusiamo e euforia, que o bom senso prevaleça e que haja, pelo menos nesta questão, um profundo e rigoroso respeito pelos limites do mandato de forma que nenhum compromisso seja tomado em nome de Cabo Verde que venha a amarrar o País. É um assunto sério de mais para ser tratado com ligeireza ou epifanias capciosas.
Só queremos, e ficaríamos muito agradados, que o PM resolva os problemas e as promessas para os quais foi eleito e que não se exorbite projectando-os para além daquilo para o qual não está mandatado pelo povo.

Falando de desenvolvimento, um outro assunto que deve ser revisto é esta lengalenga de transformar o nosso País numa plataforma giratória ou “hub” como se tornou chique dizer-se. É um discurso esgotado e já sem sentido. “Hub” de quê? Com o continente aqui ao lado que vantagens competitivas podemos nós apresentar? Porque será que a “South African Airways” nos deixou? Porque será que o porto de Dakar é mais importante do que qualquer dos nossos grandes portos?
Não obstante convivermos muito mal com a verdade e com a modéstia procuremos ser minimamente honestos. Meditemos sobre o assunto e não criemos ilusões e falsas expectativas.

Ninguém sairá de um país africano – Guiné-Bissau, Guiné-Conacry, Côte d’Ivoire, Gâmbia ou outro – para apanhar um barco ou um avião em Cabo Verde para o transportar, ou a sua mercadoria, para o outro lado do Atlântico se pode inclusive viajar de carro e transportar o seu produto em camiões directamente de e para o porto de Dakar. Seria sempre uma duplicação de operações com todos os custos inerentes. Refiro-me a países situados na mesma região e cito o nosso mais perto concorrente. Somos ilhas. Não damos continuidade. Qual seria a vantagem? Ou a mais-valia como é moda dizer-se?
Seremos sempre, e por muitos anos, apenas uma escala técnica e um destino turístico se o soubermos manter e preservar depois de outros ultrapassarem a crise de segurança em que circunstancialmente se encontram. Nunca verdadeiramente uma placa giratória.

Não brandamos mais a bandeira do “hub”! Sejamos realistas e sérios.
Outra declaração que não obstante merecesse uma análise, ainda que ligeira, mas sobre a qual não me vou aqui sequer debruçar, é a anunciada, por parte do PM, linha marítima para breve para o Senegal quando temos ainda ilhas sob este aspecto completamente descobertas como é o caso de Maio e Brava e muito mal servidas como S. Nicolau, Sal e Boa Vista. Mais uma fuga para a frente.
Começa a ser fatigante e, na maior parte das vezes, sem qualquer pertinência, a permanente presença do PM na comunicação social e chegou o momento de lhe pedir, com todo o respeito, que tenha algum comedimento verbal e alguma parcimónia em aparecer nos media.
Como tem sido, até parece que disponibiliza muito mais do seu tempo para a propaganda política do que para a efectiva governação.

E é caso para se perguntar: Por onde andam os conselheiros do senhor Primeiro-Ministro?

A.  Ferreira