Achei deveras interessante o facto do Jornal de Letras ter pedido – para o número especial comemorativo dos seus trinta e dois anos de existência – aos colaboradores habituais e a diversas personalidades do mundo cultural da lusofonia (num total de 32) que prestassem depoimento sobre o seu amor à Língua comum.
Antes de iniciar as transcrições dos excertos das “declarações de amor” será de toda a justeza referir que o Jornal de Letras é uma referência e destacada, no mundo cultural português em particular, e no da lusofonia em geral. E isto deve-se não só à qualidade dos artigos nele publicados, pelas informações que dá aos leitores interessados nas letras e nas artes em língua portuguesa, como também, pelo enorme mérito e empenho do seu Director, José Carlos Vasconcelos. Embora atrasadas, pois que foi em Março, daqui envio as minhas felicitações ao JL, acrescentando: obrigada pela boa leitura de tantos anos! Desejos de longos anos ao serviço da cultura.
Posto isto, reentremos naquilo que o título deste escrito pretende. Ora bem, com a devida vénia e pedido de autorização aos seus autores, transcrevo aqui, algumas das Declarações de Amor à Língua portuguesa proferidas por nomes conhecidos, sonantes e já consagrados no mundo cultural da lusofonia.
O que me apetecia mesmo era transcrevê-las todas, pois qualquer delas, a seu jeito e a seu modo, está amoravelmente dedicada à querida Língua, ou não fossem elas, declarações de amor! Não podendo ser, tive de apelar à dita selecção, embora sempre subjectiva, pois que abarca algumas e deixa de fora outras de igual mérito, que pretende ser uma amostra diversificada de origens dos falantes da mesma língua. Aqui vão elas:
Manuel Alegre,conhecido poeta português, chama à LP, a música secreta» e a determinada altura escreve: “Há na minha língua uma página chamada Atlântico, onde há sempre uma viagem que não acaba até outros mares e outros poemas. (…) Nas suas harmonias, nas suas dissonâncias, nas suas vogais azuis e verdes e nas suas consoantes sibilantes. Tem a cor do mar e o assobio do vento. Amo essa cor, esse assobio, esse murmúrio. E o cheiro a alga e sal (…)”
Pepetela, escritor angolano, numa interessante metáfora de amor á Língua diz: “ Leite. Língua. Leite materno. Língua materna. Os primeiros sabores, os primeiros sons. Do primeiro leite, se parte para o gosto dos outros. Também do da primeira língua se continua noutras. Em alguns casos. Nós normalmente temos a língua que ouvimos da mãe e a que ouvimos de quem nos dá colo, veste e leva a passear. Ou a que ouvimos na rua. Nem sempre coincidem (…) vários registos (…) sons que no princípio se misturam mas que, a momento dado, sabemos separar. (…)”
Onésimo Teotónio Almeida, açoriano, professor na Universidade de Brown, EUA, ficcionista, cronista e ensaísta português, escreve na sua declaração à Língua portuguesa que ele chamou de: “Acordo pré-nupcial”, o seguinte: “ (…) Como de aceitares um encontro para assinarmos este acordo em que gostaria de declarar que sim, te amo, desde que não alimentes ciúmes, nem me acuses de te amar só por causa da portugalidade, brasilianidade, ou lusafricanidade para que me abre o teu visual. (…)”.
Carlos Quiroga, galego ficcionista, poeta e professor Na Universidade de Santiago de Compostela, declara-se da seguinte forma: “(…) eu canto caetanamente o gosto de te sentir a roçar a língua de Camões”(…).
Germano Almeida, cabo-verdiano, ficcionista, afirma a sua ligação à LP, retratando bem o seu ambiente linguístico: (…) eu cresci alimentado por ambas (a língua portuguesa e a cabo-verdiana) sem nunca diferenciar qual das duas era mais suculenta pois que as usava indiferentemente, e por isso ambas fazem parte do que eu sou, razão por que não quero viver sem nenhuma delas, sei que perder uma me amputaria em metade. (…)”.
Nélida Pinõn, brasileira, ficcionista, na sua poética declaração de “amor tenaz” à LP, reitera a determinada altura: “(…) Esta língua, que é prólogo e epílogo, faz meu corpo existir. Com ela viajo pelo mar do destino. Já pelas manhãs, ela em pessoa abre as cortinas da representação cénica do mundo e assopra-me baixinho a fina aragem do mistério. (…)”.
De Timor, chega a declaração nas palavras de Luís Cardoso, ficcionista: “(…) Falar da língua portuguesa é também falar daqueles que um dia a utilizaram nas montanhas de Timor para expressarem os seus sentimentos por todo o drama que estavam vivendo. Creio que sabiam o peso exacto de cada palavra e do seu alcance (…)”.
Bem gostaria de continuar a transcrever aqui, mais dessas realmente belas declarações de amor feitas á língua comum, escritas por gente que a ama e que compôs com os seus escritos o número de 21Março/3 Abril do Jornal de Letras. Mas acontece que o meu espaço deve ser limitado.
Para terminar escolhi a declaração de um ficcionista mais jovem, angolano, Ondjaki. Ele dirige-se à língua portuguesa denominando-a de “Nome plural,”: >“(…) hoje que te escrevo, senhora dona língua portuguesa, esse teu nome plural…; de ti fizemos também corpo criativo – “língua desportuguesa”…e com o carinho que te temos, se fosses uma velhinha acariciava-te as mãos e beijava-te os olhos mas ah! Se habitasses um corpo de uma mulher madura dessas a que o sabor se pressente de olhos quietos, então confesso que a noite seria de amor, estranho amor, amor profundo (…)”
E assim, com as palavras dos outros, mas como quase nossas as sentimos também, se fecha este texto.
1 comentários:
To the point! You rock, Ondina!
Frank
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