Preocupações & Prioridades

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Sempre me preocupou a nossa presunção de modernismo proclamada aos quatro ventos como se fôssemos realmente suficientemente autónomos para decidir sobre todas as nossas pretensões.
As nossas leis são sempre as mais modernas e os nossos Códigos dos mais avançados sem nos atermos com a devida atenção na nossa sociedade, isto é, nos verdadeiros impactos que irão ter nela como tal e como conjunto de indivíduos. Numa palavra, se ela, a sociedade, é também das mais avançadas?

É óbvio que estou de acordo que devamos nivelar por cima, mas estou muito mais de acordo com a procura de condições para assim proceder.
Compreendo a ufania dos legisladores e interrogo-me sobre o que aconteceria aos nossos arquitectos e engenheiros se andassem por aí a projectar arranha-céus, grandes barragens, caminhos-de-ferro, grandes embarcações, palácios sumptuosos, enormes e aprazíveis parques de diversão, estádios esplendorosos, etc. etc.; ou a polícia a exigir carros bem equipados, tecnologias de ponta, das mais avançadas do mundo, laboratórios científicos bem apetrechados e gente superpreparada para garantir a segurança e a protecção do cidadão e fazer jus às modernas leis e aos avançados códigos?  

A resposta com certeza seria, ou estaria muito perto de: “estes tipos pensam que estamos na Suécia ou na Suíça? Ainda não atinaram que estamos em Cabo Verde, um estado minúsculo e pobre?
Falou-se já de salário mínimo. Fez-se dele durante muito tempo uma bandeira, quase desígnio nacional, sem se preocupar se ele geraria mais empregos, promoveria mais riquezas ou traria melhores condições de vida ao cabo-verdiano. A poderosa Alemanha não tem salário mínimo enquanto a Bulgária tem um ridículo salário mínimo de cerca de 6.000$00 (56 Euros). Isto apenas para citar duas situações extremas da rica União Europeia.

Hoje está sobre a mesa o subsídio de desemprego. Não deixa de ser interessante que isto acontece quando a Europa que nos ajuda, luta desesperadamente com a sua permanente diminuição, o seu encurtamento e alguns países só não o extinguem porque se trata de um direito adquirido num continente modelar em direitos sociais. Ninguém poderá estar em desacordo se houver capacidade para o sustentar. Mas num país de desempregados importaria muito mais falar de geração de emprego. A falta de emprego é que humilha, avilta, amesquinha e destrói. Não me parece que o subsídio - uma medida paliativa porque sempre limitada no tempo - combata esses danos morais e psicológicos, entre outros. Dir-me-ão: Mas mitiga! 
E aí interessa saber o seu verdadeiro impacto social, a dimensão da sua projecção no tempo e se não põe em causa hoje, mas sobretudo, no futuro, a frágil sustentabilidade da segurança social no País. Como habitualmente, escolhe-se sempre a via mais fácil sem olhar ao seu custo.

Todas essas preocupações poderão ser, abstractamente, justas. Mas serão elas próprias geradoras de riqueza e de diminuição da taxa de pobreza? Foram medidas as suas consequências de curto, médio e longo prazo?
Outra questão que se tornou uma fixação é a criação de um Tribunal Constitucional não acoplado ao STJ e da Provedoria de Justiça.

A solução actualmente existente quanto ao Tribunal Constitucional não é, de todo, uma cabo-verdura. Ela existe em países democráticos como os Estados Unidos da América – o Supremo acumula as funções do Constitucional. Porquê procurar uma solução mais dispendiosa, criando estruturas, a meu ver, puramente parasitárias dado o volume de trabalho que não terá? Ou será, como diriam alguns, para servir uma certa clientela, sem quaisquer garantias do acréscimo de eficiência ou mesmo de isenção? Será ela (autonomia) uma prioridade num país que se debate com enormes problemas socioeconómicos e com uma efectiva necessidade de um acérrimo combate à miséria?
Se a actual configuração não dá resposta satisfatória não nos enveredemos por soluções fáceis que sejam onerosas. Procuremos com estudo e reflexão as suas fragilidades e tentemos corrigi-las com um mínimo de acréscimo de esforço para o erário. Reflictamos maduramente sobre isso!

E quanto à figura de Provedor de Justiça, qual será realmente a sua força para conter os eventuais desmandos, que os há, do Governo? Não seria preferível que os partidos políticos, sobretudo os do sistema ou da esfera governativa como se tornou moda dizer-se, abrirem mãos do sufoco, do controlo excessivo que exercem sobre a sociedade civil, atendendo-a e deixando-a crescer e implantar-se livremente, sem a tutelar? Isto passaria irremediavelmente por uma análise profunda e, eventual, reforma do nosso sistema político apontando para que os partidos abrissem mão do monopólio que indubitavelmente têm da actividade política e permitissem que o “indivíduo” fora do espaço partidário pudesse também participar de forma activa na vida política do País para além do acto de votar. Não há que ter medo: os partidos serão sempre essenciais à democracia.
Não podemos, por puro mimetismo, cultivar vaidades e veleidades e depois estar de mãos estendidas a pedir que no-las alimentem de forma directa, ou indirecta através do orçamento do Estado. Estas devem-se apoiar apenas e unicamente nos nossos recursos.

Sempre vivemos à custa de doações e subsídios e devíamos ter mais atenção e contenção com o dinheiro daqueles que nos ajudam.
A procura de sinergia é uma regra de ouro. No nosso país, pequeno e arquipelágico, é um imperativo. Tal como o cálculo custo-benefício e financiamento interno ou externo se for questão de sobrevivência.

É por isso que quando me falam de Tribunal Constitucional não acoplado ao STJ e Provedoria de Justiça, eu questiono muito sinceramente da pertinência da sua prioridade.
Essas temáticas assim como outras que visam criar estruturas e mais estruturas num país que nunca produziu riqueza suficiente – essa é a grande verdade; veja-se o financiamento do OGE – para a sua manutenção, poderão constituir uma interessante e vistosa imagem da nossa democracia formal, mas no concreto não representariam uma efectiva e palpável melhoria de vida dos nossos concidadãos.

É preciso pôr a tónica naquilo que é essencial para a melhoria efectiva da qualidade de vida dos cidadãos e não naquilo que serve mais aos partidos e ao sistema do que aos cidadãos, individual e colectivamente.
A. Ferreira

0 comentários:

Enviar um comentário