quinta-feira, 15 de dezembro de 2016



Ao meu ilustre amigo Arcádio Monteiro, acérrimo defensor do uso da Língua  portuguesa nestas ilhas do Atlântico.

Finalmente o Bom Senso!...
Finalmente voltou o bom senso ao Ministério da Educação, aos altos responsáveis pelo ensino em Cabo Verde! Gostei de ouvir a declaração feita pela Ministra da Educação. Nesta altura dos acontecimentos tenho de a felicitar por algo que nos devia ser intrinsecamente natural. Mas não foi mau, antes pelo contrário, ter sido a mais alta responsável pela Educação a anunciá-la nos media, pois todos nos regozijámos com tal notícia.
Não deixa de ser um passo significativo na educação linguística e cultural das crianças, o começar-se com o português desde os Jardins de Infância.
De momento, e no estado a que a língua portuguesa em Cabo Verde se encontra, só o facto de o governo assumir a importância do ensino da LP nas escolas, é de «per se» motivo de alegria, para nós cidadãos que sofríamos com o silêncio, no mínimo, cúmplice, de governos recentes.
Que venha e será bem-vinda. tomaremos como certa de que a sua prática nas escolas seja feita através das novas metodologias do ensino de línguas vivas. Logo, bem-haja a titular da pasta da Educação e a sua  equipa.
Mas teremos, ou de mudar os professores, os monitores, pois eles são os grandes responsáveis pelo descalabro do não saber português dos alunos; ou  de os meter, a quase todos, num curso intensivo do português escrito e oral, da didáctica do ensino da Língua veicular, nos diferentes níveis de escolaridade.
  Primordial seria que na formação inicial de professores, nas instituições nacionais, fosse reservada uma extensa e cuidada aprendizagem da língua portuguesa, como língua viva e de comunicação oral e escrita. 
Infelizmente, e manda a verdade que seja dita, conhecemos o perfil dos alunos que no término do ensino secundário, procuram a formação para o professorado nas instituições universitárias de Cabo Verde. Regra geral, são os alunos de média geral de aproveitamento bem fraca, com deficiente preparação escolar no seu histórico académico, aqueles cuja média não os faculta a uma vaga ou a uma bolsa no exterior e sem qualquer aptidão vocacional, é que demandam os cursos para se tornarem os professores das escolas secundárias do país. Com semelhante quadro que esperar da qualidade do nosso ensino?
Aproveito esta oportunidade para recordar o que disse a filóloga e insuspeita Dulce Almada Duarte a propósito do tratamento  que deve ser dado à língua portuguesa e o lugar que deve ocupar na hierarquia das línguas nossas e as que nos são necessárias. Passo a transcrever:
“Agora vejamos:
Sendo o português a língua oficial em Cabo Verde, é claro que não se pode aprendê-lo exactamente como se se tratasse de uma segunda língua, como se aprende o francês ou o inglês, por exemplo. Tem-se de o aprender de tal modo que se possa utilizá-lo como se fosse língua materna. Por isso, o ideal seria que as crianças cabo-verdianas começassem a aprender o português por volta dos três ou quatro anos, na idade do Jardim de Infância. Nessa idade poderiam aprendê-lo como aprenderam o crioulo um ou dois anos antes: como língua materna.
Não sendo possível aprender o português na idade do Jardim de Infância, seria desejável que as crianças entrassem para a escola primária conhecendo, pelo menos, os rudimentos da língua oral, o que se faria no ensino pré-primário, por volta dos cinco ou seis anos. É uma idade em que as crianças ainda assimilam com extrema facilidade uma língua desconhecida ou pouco conhecida.”
Dulce Almada Duarte In “Bilinguismo ou Diglossia?” Pág. 215 – Edições Spleen, 1998
Ou seja, a língua de ensino ser de “facto e de jure” a língua portuguesa como há séculos vinha sendo leccionada nas ilhas e que infelizmente nos últimos anos andava a ser torpedeada pelas confusões feitas à volta de um falso - pois que se acreditaria nisso se o português tivesse também lugar - e muito suspeito bilinguismo.
Apenas um aparte, uma recordação interessante: Aqui há uma vintena e mais  de anos, ainda se perguntava à entrada, em certos Jardins, escolinhas da cidade da Praia, em que língua (português ou crioulo) queríamos que se falasse nas actividades com os nossos filhos. Depois…acabou. E assim também, perdemos o direito a ser bilingues. O crioulo passou a dominante em esferas onde o português coexistia.
 Pois bem, retomando a notícia agora dada a estampa, acrescentarei que já tardava esta tomada de posição. Mas valeu a reparação, pois muitos de nós, indignados e exasperados andávamos com o que se passava nas escolas públicas cabo-verdianas. Como nós, e por maioria de razão, muitos pais e Encarregados de Educação deste país já se tinham apercebido do tão baixo nível de aproveitamento e a quase dislexia cultural e linguística que se instalou nos estabelecimentos de ensino público que frequentam os filhos e educandos.
É bom que fique claro que a abordagem do português curricular e veicular não deve ser feita tal como se de uma língua estrangeira se tratasse. Se não corremos o risco de desvirtuar a história linguística e cultural das ilhas. Acontece porém, que ao ponto a que as coisas chegaram nesta matéria em Cabo Verde, os estragos feitos, os rombos e a confusão, já atingiram tal monta, que se torna igualmente relevante uma séria reflexão sobre o que queremos com a chamada língua segunda, nossa língua oficial e veicular nos curricula escolares e as metodologias que se vão adoptar no seu ensino. Quais os métodos a seguir nos Jardins-de-infância, entre outros parâmetros a ponderar para que os objectivos preconizados a médio e a longo prazo sejam alcançados.
Para terminar, e tal como comecei, manifestar a minha enorme satisfação, por ter voltado o bom senso aos altos responsáveis pela Educação em Cabo Verde. Concorde-se ou não, com a abordagem feita. Este governo, ao menos. pôs à discussão a questão da Língua portuguesa.
 Que o Governo e o Parlamento se empenhem nisso são os meus votos. Que volte a florescer a língua portuguesa, no ensino público, entre nós, como um alto desígnio dos seus falantes, são também os meus votos.


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