«Pai e Mãe, onde estais?»

sexta-feira, 27 de novembro de 2009
Hoje, mais do que no antigamente dos tempos, a sociedade cabo-verdiana enfrenta um grande e gravíssimo problema que é o de uma sociedade em que a maior parte dos seus mais jovens cidadãos é cada vez mais – por que muito mais populosa – oriunda de família numerosa, desestruturada e monoparental, jovens cidadãos, geralmente dotados de pouca orientação e de educação no sentido mais amplo e abrangente do termo. Educação, em que valores e princípios alicerçados, são transmitidos de forma sistematizada e interiorizados pela criança e pelo adolescente como os esteios mais fortes da vida gregária do Homem. São as tais aquisições que devem ser feitas, em primeira-mão, no seio da família.
Infelizmente, o que nos é dado observar actualmente nas escolas públicas e ultimamente até nas privadas, são alunos, crianças e adolescentes, uma parte significativa, não portadores desse perfil de origem.
Se por um lado, exige-se entre nós e bem que a escola seja um verdadeiro centro de informação, de formação, científica, humana e social; de conhecimentos capazes de apetrechar o formando para a vida interpessoal e profissional. Por outro lado, tal já não será possível, uma vez que – de novo algum lamento por causa disso – os próprios professores, sobretudo os de geração mais recente, trazem infelizmente na sua bagagem cultural “etapas queimadas” porque não preenchidas por princípios e valores ganhos na/e em família. Muito pouco poderão dar ao aluno em termos de partilha. Daí também explicada porque convivemos actualmente tanta deseducação, (permitam-me a expressão) na nossa sociedade!
Já não é só a pobreza material, a causadora destes males. Não sei se estudos sociológicos e estatísticos aqui eventualmente realizados sobre o assunto têm conclusões fundamentadas sobre a matéria. No meu entender, e para os tempos actuais, razões outras, como exemplo paradigmático, a completa desestruturação e até por vezes a ausência familiar, na vida das crianças, são, sem dúvida, os elementos mais perturbadores desta cadeia de desequilíbrios sociais que se verificam de forma cada vez mais assustadora entre nós e de que os meninos de rua e os delinquentes juvenis, são parte do problema.
A escola não deve substituir a família. A cada um está atribuído um papel, específico e diferenciado. Assim deve ser o entendimento desta importantíssima equação social.
Os jovens, homens e mulheres, não podem deixar que a função de criar, de orientar e de educar uma criança ao mundo trazida sejam, regra geral, entre nós, tarefas apenas da procriadora. Esta última, cada vez mais adolescente, sobrecarregada na procura da sobrevivência, desamparada, com muito pouco para dar, acaba por orientar – se é que neste caso, assim se poderá dizer – mal a criança que posteriormente é encaminhada para a escola com faltas gritantes que só o lar (paterno/materno) poderia ter preenchido, se os dois partilhassem com alguma paridade esta responsabilidade.
A quantidade populacional – com muita incidência na camada mais pobre e desqualificada da população – tem também a ver com essa desestruturação total em termos da educação infanto/juvenil.
Por outro lado, e mais grave ainda, são as crianças de rua, abandonadas pelos progenitores, que não são chamados sequer à responsabilidade criminal de largar na via pública, entregues à sua sorte, meninos e meninas cada vez mais em tenra idade.
A propósito deste drama social, li num relatório do Eurostat, as consequências nefastas de se ser “criança de rua” o seguinte. “A curto prazo, reflecte-se na alimentação, na saúde, no sucesso escolar e na integração social inexistente, mas a médio e longo prazo, as consequências verificam-se ao nível da falta de qualificações e nas dificuldades de integração no mercado de trabalho.” (fim da transcrição) Para nós, acrescentaria que aumenta a incidência da pobreza extrema e potencia a delinquência juvenil e a criminalidade adulta.
O país conhecerá, nesta matéria, algum progresso real, no dia em que o programa de algum governo futuro sufragado pela sociedade, “pegar de frente” uma política de população – em que a família nuclear ocupe lugar de primazia, sem titubeios, de forma descomplexada, sem preconceitos – e, faça disso, a sua principal bandeira no pressuposto de que a sustentabilidade social e económica, a qualidade de vida do país e dos que nele vivem passam igualmente pelo modelo familiar adoptado no que respeita à assunção das responsabilidades dos progenitores na educação e na orientação dos seus filhos.
Temos todos alguma consciência de que a complexidade do problema é enorme e a transversalidade da abordagem da causa da família em Cabo Verde constitui um verdadeiro desafio, uma interpelação profunda a futuros governantes, a responsáveis do país, à sociedade civil no seu todo e a cada um dos cidadãos. Do mesmo modo que todos estamos igualmente cientes de que a sua inscrição na agenda prioritária do país é uma exigência imperiosa. Os valores cristãos culturalmente por nós interiorizados fazem dessa causa um quase desígnio nacional.

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