Câmara Municipal da Praia: A Escola-Piloto da Governação

quarta-feira, 11 de julho de 2018

Em 2013, mais precisamente a 6 de Julho, publiquei no “coral-vermelho.blgspot.com” um artigo intitulado “Para quê facilitar se pode complicar?”. Referia-me à mediocridade e à “perversidade” da nossa administração. Era um texto relativamente extenso em que, de entre outras ocorrências, contava a minha odisseia nos labirintos administrativos da Câmara Municipal da Praia.
Passados estes cinco anos, pensei que, com a crescente informatização dos Serviços, os melhoramentos seriam exponenciais e verifico, com algum desapontamento e muita, mas muita pena, que apenas são logarítmicos (o inverso do exponencial). Mal se sentem!  Mas não em tudo, felizmente, porque nos balcões, o tratamento é agora simpático e cordial e o Gabinete Técnico mais acessível, mas nem por isso com suficientes eficiências.
É só isso, que, convenhamos, é muito pouco! Algumas diligências tornaram-se absurdas e surrealistas!!! A lógica e a sensatez desapareceram para darem lugar às mal disfarçadas mesquinhez e ganância ou à manifesta incompetência.
É preciso ter-se sempre presente que a Administração Pública visa única e simplesmente trabalhar em defesa do interesse público bem como da salvaguarda dos direitos e interesses dos indivíduos que estão sob a sua tutela. E para isto os cidadãos contribuem, para além do cumprimento de outros deveres inerentes à cidadania, com os seus impostos e taxas.
Na defesa do interesse público está, obviamente, a defesa da natureza, do ambiente. E neste capítulo a administração da Câmara da Praia é completamente negligente e incapaz. Ou indiferente?! E não me estou a referir à polémica “calcetamento ou betão – betuminoso ou hidráulico – na pavimentação do espaço público urbano”. Um capítulo em que é balançado, sopesado, quando o é, o ambiente e o conforto, havendo, querendo, espaço para as duas situações, o que na CMP só tem um sentido. Não sou um fundamentalista do “ambiente”, mas estou, seguramente, muito longe de ser o seu inimigo como parece serem os Serviços Administrativos da Câmara Municipal da Praia com a sua utilização perdulária de papel.
Usei, neste texto, alguns adjectivos que poderão parecer desadequados para qualificar os procedimentos administrativos da CMP. Procurarei, em breves linhas, justificá-los. De entre muitas situações que podia apontar, escolhi apenas uma e sua decorrência, a que me é mais próxima e recente:
Ao submeter para apreciação e aprovação um projecto de remodelação de um rés-do-chão, a funcionária que simpaticamente me atendeu deu-me um formulário para preencher onde constava vários itens relativos ao projecto e à identificação do dono da obra e, no meu caso, do procurador. Preenchido o formulário, juntei-lhe a procuração e o Projecto e entreguei. A funcionária analisa o “dossier” e diz-me:
 Falta a Planta de Localização. Tem de entregar a Planta de Localização.
Tem uma, a que serviu de base para a elaboração do Projecto, na primeira página do Caderno que tem em mãos, disse-lhe de imediato. Olha para a cópia a cores e diz-me: Tem de ser original. E olhando mais demoradamente acrescenta: E actualizada. Perguntei: mas não são vocês que passam e actualizam a Planta de Localização?
− Sim. E prestimosamente se oferece para ajudar: O Senhor dê-me os seus dados, e eu dou-lhe um número para pagar na Tesouraria. Mas também vai precisar da certidão matricial para poder ter a Planta de Localização. É fácil! E depois “levanta-as” aqui.
Mas não era assim tão fácil… O pagamento permitia apenas o agendamento de uma visita técnica para efeitos de “elaboração” (nada tinha mudado!) da Planta de Localização cuja validade é de um ano, ignorando eu, o critério da aplicação deste parâmetro: Porquê um ano e não seis meses ou três anos?
Mas então retorqui: Isto é absurdo! Os Senhores pedirem-me um documento – um não, dois - que são vocês mesmo a passar? Não faz qualquer sentido! A actualização é uma responsabilidade totalmente vossa! Não é que não deva pagar os serviços… Mas os vossos arquivos devem estar sempre actualizados. E não por “encomenda” dos cidadãos.
− Mas tem que ser assim! respondeu-me a funcionária enquanto exibia um cândido sorriso.
Deu-me, num pedaço de papel, um número, que apresentei na Caixa que me passou um recibo (em papel) para permitir o tal agendamento do qual me escuso a comentar por respeito e consideração aos técnicos. Da certidão matricial também não falo porque seria repetir-me.
Com os documentos exigidos (tudo em papel − ignoram que o uso dele – o papel – consta dos itens do combate para a preservação da natureza, do ambiente) em meu poder, juntei-os ao Projecto e entreguei o processo.
A funcionária inventariando os documentos do processo, diz-me: Ainda falta a fotocópia do Bilhete de Identidade.
Aqui passei-me com tanto descabimento e com tanta inutilidade e repliquei: Fotocópia do Bilhete de Identidade não é documento! E ela, vendo o meu estado de indignação, como se para me aplacar a ira e se demarcar da aberração, respondeu-me esboçando um sorriso: Mas, é necessária!
– Para quê, perguntei eu. A sua exigência é uma prepotência da Câmara. Já tem os dados todos registados no formulário que preenchi e confirmados por si através do BI. O processo não vai para o Gabinete Técnico? Para que querem os técnicos a fotocópia do BI.? A confirmação dos dados pessoais por si, não é válida? Não confiam em si?... Ou terão que ver a cara do requerente para saber como hão-de avaliar o Projecto?
– Não sei… é exigida!
– O que deve ser exigido, avancei eu – é o pedido de autorização para fotocopiar o meu documento (pessoal e intransmissível) de identificação. É assim nas sociedades respeitadoras dos dados pessoais… E acrescentei: Se são vocês que precisam da fotocópia porque não a fazem vocês; aliás, não é assim que procedem as instituições bancárias? Eu autorizaria – mais calmo, achei espaço para brincar. E não a fazem aqui? Eu pago, concluí.
– Não, não fazemos aqui fotocópias. Tem que ser o senhor, lá fora. É perto. Aí a uns 500 metros encontra uma reprografia, disse-me querendo ser simpática.
Lá fui eu, mais uma vez, à procura de uma reprografia para gastar o meu precioso tempo e trazer mais um papel inútil porque dispensável.
Agora sim! – diz-me ela, com um sorriso triunfal nos lábios enquanto conferia, em voz alta, os documentos do processo: Certidão matricial; Planta de Localização (passadas pela própria Câmara!!!), fotocópia do BI e o Projecto. Está tudo!
– Então, quando é que eu terei uma resposta?
– Normalmente, se estiver tudo correcto, é uma semana. Venha daqui a uma semana!
Lá fui várias vezes, durante quase três semanas, depois de passada a primeira semana de prazo. E foi preciso a intervenção de um amigo meu – mesmo estando tudo em conformidade – que lá conhece gente, para que o assunto fosse resolvido.
E agora pergunto: Não é absurdo ou mesmo surrealista que uma instituição exija para a elaboração de um processo que lhe será entregue os documentos que ela própria produz? Será ganância, irracionalidade, desorganização ou incompetência?
Ainda uma outra pergunta: Não é, por mesquinhez, indolência ou vontade expressa de complicar, que uma instituição não faz uma fotocópia, – que diz precisar, não se sabe bem para quê – de um documento do qual tem (ou pode ter) todos os dados? e que não lhe custaria, caso a fizesse, mais do que uns escassíssimos 10 escudos?
A questão não pode ser apenas dinheiro, em que uma taxa única onde todos os serviços são incorporados numa estrutura única de custo seria uma solução simples e eficaz que evitaria o vergonhoso chico-espertismo ou a esperteza saloia que se apoia em absurdas e irracionais pedidos de documentos que a própria instituição passa. É também indolência, vontade expressa de complicar, algum sado-masoquismo à mistura, numa manifestação de indiferença perante o ambiente e de sadismo em relação ao munícipe obrigando-o a expedientes dispensáveis e sacrificando a natureza, o ambiente, com papéis desnecessários e inúteis. Os documentos internos, repito, devem estar disponíveis, pelo menos, na rede interna, no sistema… O que se passa é simplesmente ridículo! Não se informatiza para continuar com o espírito de FAIMO!
Mas que ninguém se admire ou estranhe! É assim que vai o País! A CMP é a escola-piloto da nossa governação. Em tudo…
Daí que a administração e a gestão da CMP são, de certa forma, a imagem canónica da governação do País. Um País que vem sendo administrado e governado por gente sem qualquer sentido de Estado e do interesse público. Gente que em vez de servir, serve-se… tentando fazer confundir o jurídico com o político; o amiguismo com a competência; o legal com o legítimo; o verdadeiro interesse público, com o interesse meramente pessoal no desempenho de funções públicas; a negociação com negociatas; o acordo com a cedência humilhante e suspeitosa; o servilismo e a subserviência com o respeito e a admiração; o silêncio com o consentimento e o conformismo; o útil com o fútil.
Desenganem-se!... Se a oposição faz de conta e abstém-se em assuntos cruciais e importantes tornando-se cúmplice; e esfrega as mãos de contente por ver as suas políticas mais polémicas realizadas, para depois fingir-se contra, fora dos órgãos do Estado e na Comunicação Social, ou então calar-se; nós estamos todos bem atentos e não embarcamos nessas viagens fantasiosas e deslumbrantes… Conhecemos-lhes os custos e mesmo os seus mais esconsos objectivos.

A.   Ferreira

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