POSTAL AMISTOSO

domingo, 29 de janeiro de 2017

 - À atenção do Professor da Língua Portuguesa do Ensino Básico, Secundário e Universitário de Cabo Verde -

Caro colega:
Cordiais cumprimentos. Decidi dirigir-me a si desta forma – em postal amistoso -  para assim entabularmos  um diálogo, cujos termos julgo eu, ambos bem conhecemos:
1 – Gostaria de delicadamente lhe perguntar se gosta da Língua portuguesa, se a usa na  sala de aula com os seus alunos e se nas conversas que com eles costuma ter fora do contexto das aulas, usa igualmente a nossa língua portuguesa. Se respondeu SIM  às três questões, merece as felicitações dos pais e encarregados de educação dos alunos, da sociedade cabo-verdiana que contribui para que exerça dignamente a função de professor de português e queira receber as minhas felicitações  aqui também incluídas.
Se não, ainda poderá estar a tempo de arrepiar caminho e ser melhor professor.
Releve-me esta maneira, a modos que de colega mais velha, de iniciar a relação epistolar.
2 – Sabia  caro colega que não pode ser isoladamente culpado da má preparação notória que os seus alunos revelam em matéria de expressão escrita e oral da Língua portuguesa, no final dos diferentes patamares de ensino?
 Pois bem, a si coube  e cabe certamente parte importante e fundamental desta calamidade linguística que  assistimos actualmente nas nossas escolas. Mas caberá igualmente aos professores de História, de Geografia, de Estudos Sociais, de Ciências Naturais, de Física, de Química, de Matemática, entre  outras disciplinas curriculares do sistema do ensino, uma grande dose de culpa, pelo desleixo, pelo desafecto, pela falta de cuidado que esses nossos colegas, de uma maneira geral demonstram em relação à Língua veicular  do Ensino em Cabo Verde; inscrita em alongado texto na Lei de Bases do Ensino, 1990 e nas leis que regulamentam os diferentes níveis escolares do sistema escolar do País. A Língua portuguesa. Língua aliás, através da qual aqueles docentes fizeram toda o seu percurso escolar e veículo linguístico dos livros científicos e técnicos por onde estudaram durante o curso.
3 – Reconheço também que a maior parte dos professores que sai munido de Diploma dos nossos estabelecimentos de Formação, traz do antecedente, o perfil de aluno medíocre  do sub-sistema secundário. É este perfil que regra geral, demanda formação superior no País. Infelizmente, é a realidade existente e a mais visível, na sala de aula das instituições médias e superiores de formação, tanto na ilha de Santiago, como na ilha de São Vicente.
Posto isto, a questão que se coloca é a seguinte: como podemos ter docentes e ensino de qualidade quando a base e a matéria prima são  más? Que esperar do saber e da cultura de um professor que nunca leu um livro por inteiro? E mais, que desaconselha (repare bem!) os pais e os alunos a adquirirem livros de estudo e manuais escolares? Que qualidade de ensino estamos a ter nestas ilhas, depois de mais de 40 anos de investimentos de alguma grandeza na Educação?... algo, ou pior, muita coisa está erradissíma!  
4- Eu sei caro colega, porque também tenho o mesmo sentimento de  vergonha e de tristeza profunda que possui  o comum do cidadão cabo-verdiano, mais velho, quando temos notícias de que o  actual e infelizmente grande insucesso académico dos nossos estudantes universitários, nas Universidades portuguesas e brasileiras se deve em grande parte ao não domínio da Língua comum.
Muitos estudantes cabo-verdianos, são aconselhados e avisados, por vezes, já em pleno funcionamento  das suas actividades lectivas de que não estão aptos a acompanhar as aulas e os trabalhos no âmbito do curso escolhido, porque não sabem expressar-se oralmente e nem escrever correctamente a Língua portuguesa.  Que calamidade! E note caro colega, trata-se de alunos que obtiveram médias, as mais elevadas em liceus nacionais! - altamente inflacionadas, é a conclusão a que se chega -  e por isso mesmo puderam candidatar-se a cursos fora do país.
5 – Por hoje, quedo-me por aqui, esperando sobre a mesma matéria, voltar em breve a contactá-lo. Até lá, prezado colega, medite mas medite mesmo, na enorme responsabilidade que sobre si impende e no grau de exigência que deve ter consigo próprio a bem do ensino da Língua portuguesa nas nossas escolas.
Ensine com gosto e com boa preparação a nossa bela língua veicular, são os meus votos sinceros.
Sempre colega:

Ondina Ferreira

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